“Faz as malas e vem já!” – Quando a minha sogra tomou conta da nossa vida
— Faz as malas e vem já! — gritou Dona Amélia ao telefone, a voz tão alta que o meu marido, Miguel, ouviu do outro lado da sala. O nosso filho, Tomás, tinha acabado de nascer há duas semanas e eu mal conseguia distinguir o dia da noite. O leite subia-me ao peito, as lágrimas aos olhos e a exaustão era tão densa que parecia um cobertor húmido sobre o corpo.
— Mãe, por favor… — tentou Miguel, mas ela não o deixou terminar.
— Não quero saber! A casa está um caos, a menina não sabe cuidar do bebé e tu nem sabes onde estão as fraldas! — continuou ela, sem respirar entre frases.
Olhei para Miguel, à espera de apoio. Ele encolheu os ombros, impotente. Senti-me sozinha, como se a maternidade fosse um teste que já estava a falhar.
No dia seguinte, Dona Amélia apareceu sem avisar. Entrou em casa como se fosse dela, largou o casaco na cadeira e foi direita ao quarto do Tomás.
— O menino está com frio! — exclamou, cobrindo-o com mais um cobertor. — E tu, Mariana, devias estar a descansar em vez de andares feita barata tonta pela casa!
A minha mãe sempre me ensinou a ser educada, mas naquele momento só me apetecia gritar. Em vez disso, sorri e fui buscar chá para todos. Dona Amélia ficou connosco três semanas. Três semanas de críticas veladas:
— O leite materno não chega…
— Não sabes embalar o bebé…
— A sopa devia ter mais batata…
Miguel tentava acalmar as coisas, mas era como tentar apagar um incêndio com um copo de água.
Uma noite, depois de Dona Amélia se deitar, sentei-me na varanda com Miguel. Oiço ainda hoje o som dos carros na rua e o cheiro a terra molhada.
— Não aguento mais — confessei. — Sinto-me uma intrusa na minha própria casa.
Miguel passou-me o braço pelos ombros.
— Ela só quer ajudar…
— Não é ajuda quando me faz sentir inútil! — rebati, a voz embargada.
No dia seguinte, tentei impor limites. Quando Dona Amélia começou a reorganizar os armários da cozinha, pedi-lhe que parasse.
— Dona Amélia, agradeço muito a sua ajuda, mas prefiro organizar eu mesma as coisas. Assim sei onde está tudo.
Ela olhou para mim como se eu tivesse insultado toda a linhagem da família.
— Só quero facilitar-te a vida… — murmurou.
Senti-me culpada. Sempre me disseram que uma boa nora deve ser grata. Mas até onde vai a gratidão? E onde começa o direito à minha própria vida?
As semanas passaram. Dona Amélia ia e vinha, sempre com conselhos e críticas. Os meus pais viviam longe e só vinham quando podiam. Senti-me cada vez mais isolada. Comecei a duvidar de mim mesma: seria mesmo tão má mãe? Tão má dona de casa?
Um dia, Tomás ficou doente. Febre alta, choro constante. Corremos para o hospital. Dona Amélia apareceu pouco depois, já com soluções:
— Eu disse que ele estava mal agasalhado! — acusou-me.
Miguel tentou defendê-lo:
— Mãe, estas coisas acontecem…
Mas ela não quis ouvir. Passei a noite no hospital com Tomás ao colo e um nó no estômago. Quando finalmente voltámos para casa, Dona Amélia estava à porta à espera.
— Mariana, tu não sabes cuidar dele! — disse-me na cara.
Nesse momento, algo em mim quebrou. Fui para o quarto e chorei até adormecer.
Os dias seguintes foram um nevoeiro de cansaço e tristeza. Miguel começou a chegar mais tarde do trabalho para evitar os conflitos. Eu sentia-me cada vez mais sozinha.
Uma tarde, enquanto Tomás dormia, sentei-me à mesa com Dona Amélia.
— Dona Amélia — comecei, com a voz trémula — eu sei que quer ajudar. Mas preciso que confie em mim. Sou mãe do Tomás e quero aprender a cuidar dele à minha maneira.
Ela ficou em silêncio durante uns segundos eternos.
— Eu só quero o melhor para vocês… — murmurou finalmente.
— Eu sei — respondi — mas preciso do seu apoio, não de críticas.
Ela levantou-se sem dizer mais nada e foi para o quarto. Achei que tinha estragado tudo.
Nessa noite, Miguel chegou mais cedo. Contei-lhe o que se tinha passado.
— Fizeste bem — disse ele. — Mas vai demorar até ela perceber.
Os meses passaram devagar. Dona Amélia começou a vir menos vezes. Quando vinha, tentava controlar-se mais. Eu também aprendi a impor limites sem me sentir culpada — pelo menos na maior parte dos dias.
Mas os conflitos não desapareceram completamente. No Natal desse ano, durante o jantar em família, Dona Amélia não resistiu:
— O Tomás devia estar mais agasalhado…
Desta vez sorri e respondi:
— Obrigada pela preocupação, mas está tudo bem assim.
Miguel apertou-me a mão por baixo da mesa. Senti-me finalmente dona do meu espaço.
Ainda hoje há dias difíceis. Às vezes pergunto-me se algum dia serei suficiente aos olhos da minha sogra. Mas aprendi que ser boa nora não significa anular-me como mulher ou mãe.
E vocês? Já sentiram que alguém tentou tomar conta da vossa vida? Como encontraram o vosso lugar sem perder quem são?