O Segredo Depois do Parto: Uma Noite, Uma Mensagem, Uma Escolha

— Não pode ser… — murmurei, sentindo o coração a bater tão forte que temi acordar o bebé. O quarto do hospital estava mergulhado numa penumbra tranquila, apenas interrompida pelo som suave da respiração da minha filha recém-nascida. O Luís, meu namorado, dormia profundamente na cadeira ao lado da cama, exausto depois de um parto longo e difícil. Eu só queria saber as horas, mas ao pegar no telemóvel dele, a tela acendeu-se com uma notificação inesperada: “Amo-te. Diz-me quando estiveres sozinho. — Sofia”.

Por um momento, pensei que estivesse a alucinar, talvez efeito das dores ou da epidural que ainda me deixava meio dormente. Mas não. A mensagem estava ali, clara, crua, impossível de ignorar. Senti um frio percorrer-me o corpo, uma mistura de raiva e incredulidade. Como é que ele podia? Logo agora? Depois de tudo o que passámos juntos?

Olhei para o Luís, tão sereno, tão alheio ao turbilhão que me invadia. Lembrei-me de todas as noites em que sonhámos com esta família, das conversas sobre nomes para o bebé, dos planos para o futuro. E agora isto. Senti vontade de gritar, de o acordar e exigir explicações naquele instante. Mas contive-me. O choro da minha filha trouxe-me de volta à realidade.

Peguei nela com cuidado, tentando não acordar o Luís. Enquanto a embalava, lágrimas silenciosas escorriam-me pelo rosto. O cheiro a leite e a pele macia dela eram um consolo amargo. “Não posso desmoronar agora”, pensei. “Ela precisa de mim.”

As horas passaram lentas. O Luís acordou com um sorriso cansado e veio sentar-se ao meu lado.

— Dormiste alguma coisa? — perguntou, acariciando-me o cabelo.

— O suficiente — respondi, desviando o olhar.

Ele não percebeu nada. Continuou a falar sobre como a nossa filha era linda, como se parecia comigo. Eu só via a mensagem a piscar na minha mente como um letreiro luminoso.

Quando finalmente ficámos sozinhos — os meus pais tinham acabado de sair para ir buscar café — não aguentei mais.

— Luís… quem é a Sofia?

Ele ficou pálido. O sorriso desapareceu-lhe dos lábios.

— O quê? Porquê essa pergunta agora?

— Porque vi uma mensagem dela no teu telemóvel. Diz que te ama e pede para falares com ela quando estiveres sozinho.

O silêncio que se seguiu foi ensurdecedor. Ele passou as mãos pelo rosto, suspirou fundo.

— Não é nada do que estás a pensar…

— Então explica-me! — interrompi, sentindo a voz tremer.

— É uma amiga do trabalho… Ela está a passar por uma fase difícil e… talvez tenha confundido as coisas.

— Confundido? Luís, ela diz que te ama! — As lágrimas voltaram sem pedir licença. — Eu acabei de dar à luz tua filha e tu…

Ele tentou pegar-me na mão, mas afastei-me.

— Juro que nunca aconteceu nada entre nós — insistiu ele. — Eu nunca te traí!

— Então porque não me disseste nada? Porque é que ela se sente à vontade para te mandar mensagens destas?

Ele ficou calado. O silêncio era resposta suficiente.

Nesse momento entrou a enfermeira para ver como estávamos. Fingi normalidade enquanto ela verificava os sinais vitais da bebé e me perguntava se precisava de alguma coisa. Por dentro, sentia-me a desmoronar.

Quando ficámos novamente sozinhos, Luís tentou justificar-se mais uma vez.

— Eu devia ter-te contado… Ela começou a aproximar-se demasiado nos últimos meses e eu não soube pôr limites. Mas nunca passou disso! Eu amo-te a ti, só a ti!

Queria acreditar nele, queria mesmo. Mas algo dentro de mim tinha mudado. A confiança estava ferida de morte.

Os dias seguintes foram um tormento silencioso. Os meus pais notavam o meu distanciamento mas eu não conseguia falar sobre aquilo com ninguém. Só conseguia olhar para a minha filha e prometer-lhe que nunca lhe faltaria nada — mesmo que isso significasse criar coragem para seguir sozinha.

Quando finalmente voltámos para casa, o ambiente estava pesado. O Luís tentava compensar com gestos carinhosos, mas eu sentia-me distante, fria. Uma noite, depois de adormecer a bebé, sentei-me na sala e encarei-o.

— Preciso de saber toda a verdade — disse-lhe. — Não consigo viver assim.

Ele hesitou antes de responder.

— Houve mensagens… algumas conversas mais íntimas… mas nunca houve contacto físico. Eu arrependo-me muito. Não quero perder-te.

Senti uma mistura de alívio e revolta. Ele admitira parte da verdade, mas isso não apagava o que eu sentia.

— Preciso de tempo — disse-lhe apenas.

As semanas passaram e eu fui-me reconstruindo aos poucos. Procurei apoio numa psicóloga do centro de saúde; falei com amigas sobre o que sentia; comecei a sair mais com a minha filha, só nós as duas, redescobrindo Lisboa através dos olhos dela.

O Luís continuou presente, esforçando-se por reconquistar a minha confiança. Por vezes pensava em perdoá-lo; noutras sentia vontade de recomeçar do zero sem ele.

Um dia, enquanto passeava com a minha filha pelo Jardim da Estrela, vi um casal jovem a rir-se juntos no banco ao lado. Senti inveja daquela leveza, daquela inocência perdida.

Perguntei-me: será possível reconstruir algo depois de uma traição? Ou será melhor aceitar que há feridas que nunca saram completamente?

Hoje olho para trás e vejo uma mulher mais forte do que imaginava ser possível. Ainda não sei qual será o futuro da nossa família — mas sei que mereço respeito e verdade acima de tudo.

E vocês? Já passaram por algo assim? Acham que é possível perdoar e seguir em frente? Ou há limites para o amor?