Quando o Meu Mundo Ruiu: O Dia em que Descobri que o Meu Marido ia Ser Pai Outra Vez
— Não me mintas, António! Diz-me a verdade, por favor! — gritei, com a voz embargada, enquanto as minhas mãos tremiam tanto que mal conseguia segurar na chávena de chá. O silêncio dele era ensurdecedor. O relógio da cozinha marcava 22h17 e o cheiro a sopa de legumes pairava no ar, misturado com a tensão que se podia cortar à faca.
Ele olhou para mim, olhos baixos, e finalmente murmurou:
— A Marta está grávida.
O chão fugiu-me dos pés. Senti-me a cair num poço sem fundo, onde o eco das palavras dele se repetia sem parar: “A Marta está grávida.” A Marta, a colega do escritório, vinte anos mais nova do que eu. O António, meu marido há trinta anos, pai dos meus dois filhos, o homem com quem partilhei sonhos, dívidas e domingos de chuva no sofá.
Lembro-me de ter ficado ali sentada, imóvel, enquanto ele tentava justificar-se:
— Não foi planeado… Eu nem sei como aconteceu… — balbuciava ele, como se isso fosse desculpa para o que tinha feito.
A raiva subiu-me à garganta. Atirei-lhe com tudo o que me vinha à cabeça:
— E os nossos filhos? E eu? Achas que isto é só contigo? Achas que podes destruir uma família inteira assim?
Ele chorou. Pela primeira vez em anos vi o António chorar. Mas não senti pena. Senti-me traída, humilhada, velha. Senti-me invisível.
Os dias seguintes foram um nevoeiro. Os meus filhos, a Inês e o Miguel, perceberam logo que algo não estava bem. A Inês confrontou-me na cozinha:
— Mãe, o que se passa? O pai anda estranho… — perguntou ela, olhos vermelhos de preocupação.
Não consegui mentir-lhe. Contei-lhe tudo. Ela chorou comigo. O Miguel fechou-se no quarto e não quis falar durante dias.
A família do António ficou do lado dele. “São coisas da vida”, disse a sogra, como se fosse normal um homem de cinquenta e cinco anos engravidar uma rapariga de trinta e destruir uma família inteira.
As minhas amigas tentaram animar-me:
— Tu és forte, Ana! Vais ultrapassar isto! — dizia a Carla, enquanto me levava ao café para tentar distrair-me.
Mas eu sentia-me vazia. Passei noites sem dormir, a olhar para o teto do quarto onde já não conseguia partilhar a cama com ele. O cheiro dele nos lençóis era insuportável.
Comecei a questionar tudo: teria sido eu demasiado dedicada à família? Teria deixado de ser mulher para ser só mãe? Teria sido cega aos sinais?
O António tentou pedir desculpa. Mandava mensagens:
— Perdoa-me. Não quero perder-te.
Mas eu já não conseguia olhar para ele sem sentir nojo e tristeza.
A Marta ligou-me uma vez. Queria “falar como mulheres adultas”. Recusei. Não tinha nada para lhe dizer. Ela era o símbolo de tudo o que eu tinha perdido: juventude, esperança, futuro.
Os meses passaram devagar. O divórcio foi inevitável. O António saiu de casa com duas malas e um olhar derrotado. Os vizinhos cochichavam à minha passagem. A minha mãe dizia:
— Tens de ser forte pelos teus filhos.
Mas eu sentia-me uma sombra de mim mesma.
Foi a Inês quem me obrigou a reagir:
— Mãe, não podes deixar que isto te destrua! Tu és muito mais do que o pai te fez!
Comecei a ir ao ginásio. Voltei a pintar o cabelo. Inscrevi-me num curso de fotografia na junta de freguesia. Aos poucos, fui recuperando pedaços de mim que julgava perdidos.
Um dia, encontrei o António na rua com a Marta e o bebé ao colo. Ele olhou para mim com um misto de vergonha e saudade. Cumprimentei-o com um aceno frio e segui caminho.
À noite, sozinha na minha sala renovada, pensei em tudo o que tinha vivido. Percebi que sobrevivi ao pior dia da minha vida e que estava pronta para recomeçar.
Pergunto-me muitas vezes: será possível perdoar uma traição destas? Ou será que há feridas que nunca saram? O que fariam vocês no meu lugar?