Quando a Minha Sogra, Dona Amélia, Invadiu a Nossa Casa: Uma História de Intrigas Familiares
— Não acredito que fizeste isto sem me perguntar, Ricardo! — gritei, com a voz embargada pela exaustão e pelo medo do que estava por vir. O trovão ribombou lá fora, como se o universo quisesse sublinhar o drama que se desenrolava na nossa sala. O nosso filho, Tomás, chorava no quarto ao lado, e eu sentia-me dividida entre ir acalmá-lo e continuar a discussão com o meu marido.
Ricardo olhou para mim com aquele ar de quem acha que está a fazer o melhor para todos. — A minha mãe não tinha para onde ir, Marta. O meu pai foi-se embora com aquela mulher do café e deixou-a sozinha. Não podia deixá-la na rua!
Eu sabia que Dona Amélia estava a passar por um momento difícil. Mas também sabia que ela nunca gostou de mim. Desde o início do nosso namoro, fazia questão de me lembrar que eu não era boa o suficiente para o filho dela. E agora ia viver connosco? Sem sequer me perguntarem?
A minha mãe, Teresa, vinha cá quase todos os dias ajudar-me com o Tomás. Ela era o meu apoio, a minha âncora. Mas até ela já começava a criticar Ricardo por não ajudar mais em casa. Agora, com Dona Amélia ali, sentia que o meu espaço estava a desaparecer.
Na manhã seguinte, acordei com o cheiro intenso de café e torradas queimadas. Fui à cozinha e encontrei Dona Amélia de avental, a mexer no fogão como se fosse dona da casa.
— Bom dia, Marta. Espero que não te importes, mas achei que precisavas de uma ajudinha — disse ela, sem sequer olhar para mim.
— Obrigada, Dona Amélia — respondi, tentando soar cordial. Mas por dentro sentia-me invadida.
Os dias seguintes foram um teste à minha sanidade. Dona Amélia criticava tudo: desde a forma como eu dava banho ao Tomás até à maneira como organizava os armários da cozinha.
— No meu tempo não era assim — dizia ela, abanando a cabeça enquanto eu tentava dar papa ao bebé.
Ricardo parecia aliviado por ter a mãe ali. Passava mais tempo no trabalho e menos tempo connosco. Quando chegava a casa, limitava-se a perguntar se estava tudo bem e fugia para o duche.
Uma noite, depois de adormecer o Tomás, sentei-me na varanda com a minha mãe.
— Filha, tens de impor limites — disse Teresa, apertando-me a mão. — Esta casa é tua também.
— Mas como? O Ricardo nem me ouve… E Dona Amélia faz-me sentir uma estranha na minha própria casa.
— Tens de falar com ele. Não podes deixar isto continuar assim.
Ganhei coragem e esperei pelo momento certo. Numa sexta-feira à noite, depois do jantar (que Dona Amélia fez questão de preparar), sentei-me com Ricardo na sala.
— Precisamos de conversar — disse-lhe.
Ele suspirou. — Já sei o que vais dizer…
— Não sabes nada! — interrompi. — Sinto-me sufocada! A tua mãe critica tudo o que faço. A minha mãe já nem quer vir cá porque sente-se desconfortável. E tu… tu desapareces!
Ricardo ficou em silêncio durante uns segundos eternos.
— Achas que é fácil para mim? O meu pai abandonou-nos! A minha mãe está destroçada…
— E eu? Eu também estou! Estou sozinha nesta casa cheia de gente!
As palavras pairaram no ar como uma nuvem negra. Pela primeira vez em meses, vi lágrimas nos olhos do Ricardo.
Naquela noite não dormi. Fiquei a olhar para o teto, a pensar em tudo o que tinha perdido desde que Dona Amélia entrou na nossa vida: a paz, a intimidade com o Ricardo, até a relação com a minha mãe.
No dia seguinte, decidi sair de casa com o Tomás e ir passar o fim de semana com a minha mãe. Precisava de respirar.
Quando voltei no domingo à noite, encontrei Dona Amélia sentada à mesa da cozinha com uma mala feita ao lado.
— Vou para casa da minha irmã em Braga — disse ela, sem emoção na voz. — O Ricardo explicou-me tudo. Não quero ser um peso.
Senti um misto de alívio e culpa. Tentei convencê-la a ficar até encontrar uma solução melhor, mas ela recusou.
Depois que ela saiu, Ricardo abraçou-me como há muito não fazia.
— Desculpa… Devia ter-te ouvido desde o início.
A nossa vida voltou ao normal aos poucos. Mas as feridas ficaram. A relação com Dona Amélia nunca mais foi igual. E eu aprendi que os limites são essenciais — mesmo quando se trata de família.
Às vezes pergunto-me: será que fui egoísta? Ou será que finalmente aprendi a proteger aquilo que é meu? E vocês? Já passaram por algo assim? Como lidaram?