O Meu Genro Quer Comprar uma Casa e Colocá-la em Nome da Mãe — E Eu Não Consigo Aceitar

— Não posso acreditar no que estou a ouvir, Sofia! — gritei, sentindo o coração a bater tão forte que quase me sufocava. — Vais mesmo deixar o Rui pôr a casa em nome da mãe dele? E tu? E os teus filhos? Onde é que ficas nesta história?

A minha filha olhou para mim com olhos cansados, as olheiras profundas de quem não dorme há semanas. O pequeno Tomás brincava no tapete da sala, alheio à tempestade que se abatia sobre nós. Sofia suspirou, tentando manter a voz firme:

— Mãe, por favor, não compliques. O Rui acha que é mais seguro assim. A mãe dele ajudou-nos com o empréstimo, e ele quer retribuir…

— Retribuir? — interrompi, quase a chorar. — E tu? Vais viver numa casa que nunca será tua? E se alguma coisa correr mal? Já pensaste nisso?

Ela desviou o olhar, mexendo nervosamente nas mãos. Eu sabia que estava a magoá-la, mas não conseguia evitar. Desde pequena que sempre lutei para que a Sofia tivesse tudo o que eu nunca tive: segurança, estabilidade, um lar. Agora, sentia que tudo isso estava prestes a desmoronar-se.

O Rui apareceu à porta da sala, com aquele ar de quem acha que tem sempre razão.

— Dona Helena, não se preocupe tanto. Isto é só uma formalidade. A minha mãe vai ajudar-nos com a entrada e o banco exige um fiador. Faz sentido pôr a casa em nome dela.

— Faz sentido para si, Rui. Mas e para a minha filha? Para os meus netos? — respondi, tentando controlar a raiva.

Ele encolheu os ombros, como se não fosse nada de especial.

— Se confia em mim, não há problema nenhum.

Aquelas palavras ficaram-me atravessadas na garganta. Confiança? Como podia confiar em alguém que punha tudo em risco assim?

Nessa noite, não consegui dormir. Oiço o tic-tac do relógio na parede do meu quarto como se fosse um martelo a bater na minha cabeça. Lembro-me de quando eu própria fui enganada pelo meu ex-marido — pai da Sofia — que me deixou sem nada depois de anos de casamento. Jurei a mim mesma que nunca deixaria a minha filha passar pelo mesmo.

No dia seguinte, fui ter com a minha irmã Teresa. Precisava de desabafar.

— Helena, tens de ter calma — disse ela, servindo-me um chá quente. — Os tempos mudaram. Hoje em dia os casais fazem as coisas de outra maneira…

— Mudaram? Mudaram para pior! — atirei, quase a soluçar. — A Sofia está grávida outra vez! E se o Rui um dia se farta dela? Fica ela e os miúdos na rua?

Teresa pousou a mão sobre a minha.

— Fala com ela com calma. Não faças ameaças. Mostra-lhe as consequências.

Voltei para casa com o coração apertado. Passei dias sem conseguir falar normalmente com a Sofia. O Rui evitava-me sempre que podia. Até o pequeno Tomás parecia sentir o peso do ambiente pesado lá em casa.

Uma noite, ouvi-os a discutir no corredor:

— Não percebes? A tua mãe está sempre a meter-se! — dizia o Rui, irritado.

— Ela só está preocupada comigo! — respondeu a Sofia, quase a chorar.

— Pois devia preocupar-se era com a própria vida!

Senti-me esmagada por dentro. Será que estava mesmo a exagerar? Ou estaria apenas a ver perigos onde eles não existiam?

Os dias passaram e o ambiente foi ficando cada vez mais insuportável. Um domingo à tarde, durante o almoço de família, não aguentei mais:

— Rui, diz-me uma coisa: se amas mesmo a minha filha, porque é que não pões a casa em nome dos dois?

Ele largou os talheres e olhou-me nos olhos:

— Porque não confio no sistema português! Se um dia nos separarmos, prefiro que tudo fique na família.

— Na família? Na tua família! — respondi imediatamente.

A mãe dele, Dona Lurdes, que até então tinha estado calada, decidiu intervir:

— Helena, eu só quero ajudar os meninos. Se for preciso faço um documento a dizer que eles podem viver lá enquanto quiserem.

Olhei para ela e vi sinceridade nos olhos. Mas também vi medo: medo de perder o filho, medo de perder o controlo.

Depois desse almoço, tentei falar com Sofia sozinha:

— Filha, lembra-te do que aconteceu comigo e ao teu pai. Não quero ver-te passar pelo mesmo.

Ela abraçou-me com força.

— Mãe… eu sei que só queres o melhor para mim. Mas eu amo o Rui. E preciso acreditar nele.

Chorei baixinho no ombro dela. Senti-me impotente.

As semanas passaram e as obras na nova casa começaram. Todos os dias via fotos das paredes pintadas de branco, do quarto dos miúdos decorado com nuvens azuis… E todos os dias sentia um nó no estômago.

Até que um dia recebi uma chamada da Sofia:

— Mãe… podes vir cá?

Quando cheguei à casa nova, encontrei-a sentada nas escadas da entrada, com as mãos na barriga já saliente e lágrimas nos olhos.

— O Rui foi embora — disse ela entre soluços. — Disse que precisava de pensar… Que isto tudo estava a ser demais…

Sentei-me ao lado dela e abracei-a com todas as forças do mundo.

— Vai correr tudo bem, filha. Estou aqui contigo.

Naquela noite fiquei lá em casa. O Tomás dormiu agarrado ao meu braço e eu fiquei acordada horas a fio a pensar no futuro deles.

Dois dias depois o Rui voltou. Pediu desculpa à Sofia e prometeu mudar. Disse que ia falar com a mãe para reverem o contrato da casa.

No final, decidiram fazer um acordo: metade da casa ficaria em nome da Dona Lurdes e metade em nome da Sofia. Não era perfeito, mas era melhor do que nada.

Hoje olho para trás e pergunto-me: fiz bem em meter-me tanto? Ou devia ter confiado mais na capacidade da minha filha para tomar decisões? Será que proteger quem amamos justifica magoar quem está à nossa volta?

E vocês? O que fariam no meu lugar?