Três vezes mãe em um só ano: Minha luta, minha força

— Outra vez, Sofia? — A voz da minha mãe ecoou pela cozinha, carregada de incredulidade e cansaço. Eu estava sentada à mesa, as mãos trémulas sobre o tampo de madeira gasto, tentando encontrar coragem para encará-la. — Mãe, eu… — tentei começar, mas ela interrompeu-me com um gesto brusco. — Não me digas que vais ter outro filho. Não depois de tudo o que passaste este ano.

O silêncio caiu pesado entre nós. O relógio de parede marcava sete da manhã, mas eu já sentia o peso de um dia inteiro nos ombros. O cheiro do café misturava-se ao aroma do pão quente, mas nada conseguia acalmar o tumulto dentro de mim.

Nunca planeei ser mãe três vezes num só ano. Nem sequer sabia que era possível, até acontecer comigo. O Tomás nasceu em janeiro, fruto de uma relação que já estava por um fio. O Pedro chegou em setembro, depois de uma noite de solidão e desespero com o Miguel, um amigo de infância que sempre me prometeu o mundo. E a pequena Leonor… bem, a Leonor foi a surpresa que me fez questionar tudo o que pensava saber sobre mim mesma e sobre o amor.

As pessoas na vila falavam. Sussurravam quando eu passava na rua, olhavam-me de lado no supermercado, e até a dona Rosa, que sempre me vendia fruta fresca com um sorriso, agora mal me cumprimentava. “Três filhos em doze meses? E nenhum deles gémeo?” — ouvi mais vezes do que consigo contar. O meu pai deixou de falar comigo durante semanas. Só a minha avó, Dona Amélia, me segurava a mão e dizia baixinho: — Filha, cada criança é uma bênção. Não deixes ninguém convencer-te do contrário.

Mas havia dias em que eu própria duvidava disso. Quando o Tomás chorava sem parar durante a noite e o Pedro acordava com febre ao mesmo tempo em que a Leonor precisava de mamar, sentia-me a afundar num mar de culpa e exaustão. O Miguel desapareceu assim que soube da gravidez do Pedro. O pai do Tomás, o Rui, limitava-se a enviar mensagens frias: “Precisas de dinheiro?” Nunca perguntou como eu estava.

— Sofia, tu não podes continuar assim — insistia a minha mãe, os olhos vermelhos de preocupação. — Tens de pensar nas crianças. Tens de pensar em ti.

Eu queria gritar que pensava neles todos os dias. Que cada decisão era feita com eles em mente. Mas como explicar o medo constante de não ser suficiente? Como explicar a solidão que me esmagava quando todos dormiam e eu ficava acordada a olhar para o teto, perguntando-me se algum dia voltaria a ser apenas Sofia e não só “a mãe dos três”?

A vida tornou-se uma rotina exaustiva: acordar antes do sol, preparar biberões, trocar fraldas, acalmar choros, correr para o centro de saúde com febres e tosses intermináveis. Os meus amigos afastaram-se aos poucos. As mensagens tornaram-se raras; os convites para sair desapareceram por completo. Só restava eu e as crianças — e às vezes nem eu sabia se ainda estava ali.

Uma tarde de outono, sentei-me no banco do jardim enquanto o Tomás brincava na areia e o Pedro dormia no carrinho. A Leonor mamava tranquila no meu colo. Uma senhora aproximou-se e sentou-se ao meu lado. Olhou para mim com ternura e disse: — Lembro-me de quando tive os meus três quase seguidos. Foi duro… mas passou tão depressa. Não se esqueça de cuidar de si também.

Chorei ali mesmo, sem vergonha. Pela primeira vez em meses, senti-me compreendida. Talvez não estivesse tão sozinha como pensava.

Os meses passaram devagar. Aprendi a pedir ajuda — à minha mãe, à avó Amélia, até à vizinha Carla, que se ofereceu para ficar com as crianças enquanto eu ia ao supermercado sozinha pela primeira vez em quase um ano. Aprendi a perdoar-me pelos dias em que gritava ou chorava no banho para ninguém ouvir. Aprendi a aceitar que não era perfeita — mas era suficiente.

O Natal chegou com frio e esperança renovada. A família reuniu-se à volta da mesa; o meu pai finalmente pegou no Tomás ao colo e sorriu-lhe como se nunca tivesse estado zangado comigo. A minha mãe fez rabanadas e contou histórias antigas à Leonor enquanto o Pedro tentava roubar doces da mesa.

Nessa noite, depois de todos adormecerem, sentei-me junto à janela com uma chávena de chá quente nas mãos. Olhei para os meus filhos a dormir e senti uma paz estranha, como se finalmente tivesse encontrado o meu lugar no mundo — mesmo que esse lugar fosse caótico e barulhento.

Ainda há dias difíceis. Ainda há olhares e comentários sussurrados na vila. Mas agora sei que sou mais forte do que pensava. Que cada lágrima foi uma semente de coragem plantada no meu coração.

Pergunto-me muitas vezes: quantas mulheres vivem histórias como a minha em silêncio? Quantas encontram força onde achavam não haver mais nada? E vocês… já sentiram que precisavam de perdoar a si próprios para poderem seguir em frente?