Vi o Meu Noivo com a Ex-Mulher e os Filhos: Cancelei o Casamento – A Minha História
— Não me mintas, Mário! Eu vi tudo, ouvi tudo! — gritei, com a voz embargada, enquanto as lágrimas me queimavam o rosto. O eco da minha própria voz parecia encher o pequeno corredor do nosso apartamento em Almada, onde até há poucos minutos eu acreditava que seríamos felizes para sempre.
Ele ficou parado, com as mãos nos bolsos, desviando o olhar. O silêncio dele era ensurdecedor. Eu sentia o coração a bater tão forte que quase me sufocava. Como é possível que tudo tenha mudado numa única noite?
Naquela tarde, decidi surpreender o Mário. Tinha acabado de sair do trabalho mais cedo — sou professora numa escola secundária — e passei pelo café onde ele costumava ir depois do expediente. Vi-o sentado numa mesa ao fundo, mas não estava sozinho. À sua frente, a ex-mulher, Teresa, e os dois filhos adolescentes, o Diogo e a Matilde. Sorriam, falavam baixo, partilhavam um bolo de chocolate. O Mário parecia outro homem: leve, descontraído, quase feliz.
Fiquei ali, parada à porta, sem saber se devia entrar ou fugir. O meu instinto dizia-me para ir embora, mas algo me prendeu ao chão. Observei-os durante minutos que pareceram horas. Vi o Mário a segurar na mão da Teresa quando ela chorou baixinho. Vi-o a limpar as lágrimas da Matilde com uma ternura que nunca vi nos gestos dele comigo. Senti-me uma intrusa na vida dele, uma figurante numa história que não era a minha.
Quando finalmente cheguei a casa, ele já lá estava. Senti o cheiro do seu perfume misturado com o aroma do jantar que preparara — massa à bolonhesa, o meu prato preferido. Mas nada disso importava.
— Preciso de falar contigo — disse-lhe assim que entrei.
Ele tentou sorrir, mas os olhos dele denunciavam cansaço e culpa.
— Eu sei que não devia esconder nada de ti — começou ele, hesitante. — Mas é complicado… Eles são a minha família também.
— E eu? O que sou eu para ti? — perguntei, sentindo-me pequena, quase invisível.
O Mário sentou-se à mesa e passou as mãos pelo cabelo grisalho.
— Tu és tudo para mim, Ana. Mas não posso abandonar os meus filhos. A Teresa está a passar uma fase difícil…
— E tu vais sempre ser o herói dela? Vais sempre correr para ela quando ela precisar? — atirei, incapaz de conter o ciúme e a dor.
Ele não respondeu. O silêncio dele foi mais cruel do que qualquer palavra.
Naquela noite não dormi. Fiquei deitada na cama a olhar para o teto, a pensar em tudo o que tinha vivido nos últimos dois anos ao lado do Mário. Lembrei-me do dia em que nos conhecemos no supermercado — ele deixou cair uma caixa de ovos e eu ajudei-o a apanhar tudo do chão. Rimos tanto nesse dia… Parecia destino.
Mas agora percebia que talvez eu tivesse sido apenas um remendo na vida dele. Alguém para preencher os vazios quando a família verdadeira não estava por perto.
No dia seguinte, liguei à minha mãe. Ela sempre foi direta:
— Filha, tu mereces alguém inteiro. Não alguém dividido entre ti e outra família.
As palavras dela ecoaram na minha cabeça durante todo o dia. No trabalho, mal consegui dar aulas. Os alunos perceberam que algo não estava bem — até a Inês, a colega mais nova do grupo de professores, me perguntou se precisava de conversar.
À noite, sentei-me com o Mário na sala. Ele tentou abraçar-me, mas eu afastei-o.
— Não posso casar contigo — disse-lhe, com a voz trémula mas firme. — Não quero viver à sombra da tua antiga vida.
Ele ficou em choque. Vi nos olhos dele um misto de tristeza e alívio. Talvez ele próprio soubesse que nunca conseguiria cortar o cordão com o passado.
— Ana…
— Não digas nada — interrompi. — Preciso de pensar em mim pela primeira vez em muitos anos.
Os dias seguintes foram um tormento. Recebi mensagens dos amigos em comum: uns apoiavam-me, outros diziam que estava a exagerar. A Teresa ligou-me uma vez:
— Ana, desculpa… Eu nunca quis causar problemas entre vocês.
Mas eu sabia que não era culpa dela. Nem dos filhos. Era da vida — da forma como as histórias se entrelaçam e nos deixam presos em teias invisíveis.
A solidão bateu-me à porta com força. Os serões passaram a ser passados sozinha no sofá, com um copo de vinho e as novelas na televisão como companhia. Senti falta do Mário todos os dias: do cheiro dele, das conversas longas sobre livros e música portuguesa, das caminhadas à beira Tejo ao domingo de manhã.
Mas também senti alívio. Alívio por não ter de competir com fantasmas do passado dele. Por poder respirar sem medo de ser sempre a segunda escolha.
Os meses passaram devagar. Fui reconstruindo a minha vida aos poucos: voltei a pintar, inscrevi-me num curso de cerâmica, viajei sozinha até ao Douro e sentei-me à beira-rio a escrever no meu diário.
Um dia encontrei o Mário por acaso no mercado municipal. Estava com os filhos — pareciam felizes. Ele olhou para mim com tristeza e carinho ao mesmo tempo.
— Estás bem? — perguntou ele.
Sorri-lhe com sinceridade pela primeira vez em muito tempo.
— Estou melhor do que nunca — respondi.
Agora olho para trás e vejo tudo com outros olhos. Pergunto-me se algum dia teria sido feliz ao lado dele ou se teria passado a vida inteira à espera de um lugar que nunca seria verdadeiramente meu.
E vocês? Já sentiram que estavam apenas a preencher um vazio na vida de alguém? Será que vale a pena lutar por um amor dividido ou é melhor escolhermos ser inteiros sozinhos?