Quando finalmente disse: Basta! – Como defendi o meu filho dos sogros dele

— Não aguento mais, António! — gritei, a voz embargada, enquanto via o meu filho baixar os olhos, sentado à mesa da cozinha. O cheiro do café frio misturava-se ao silêncio pesado que pairava entre nós. — Eles estão a destruir-te e tu deixas! Não vês?

Ele não respondeu. Limitou-se a mexer a chávena, os dedos trémulos, como se procurasse ali dentro uma resposta para tudo o que lhe estava a acontecer. Eu sabia que estava a ser dura, talvez até injusta, mas já não conseguia calar a revolta que me consumia há meses.

Tudo começou quando o António conheceu a Sofia. Ela era simpática, doce, mas os pais… Os pais eram outra história. O senhor Manuel e a dona Graça sempre fizeram questão de mostrar que a filha merecia o melhor — e que o meu filho nunca estaria à altura. No início, tentei ignorar. Achei que era coisa de mães ciumentas, mas com o tempo tornou-se impossível não ver.

Lembro-me de um domingo em casa deles. A Sofia estava grávida do meu neto, e eu queria ajudar. Dona Graça olhou-me de cima a baixo quando sugeri que podíamos organizar juntas o quarto do bebé.

— Não se preocupe, D. Teresa — disse ela, com aquele sorriso gelado —, nós tratamos de tudo à nossa maneira.

Senti-me pequena, inútil. Mas calei-me. Por amor ao António.

Os meses passaram e as coisas só pioraram. O António começou a trabalhar para o sogro na empresa de construção. Achei estranho — ele sempre quis ser professor — mas disse-me que era só até arranjar algo melhor. Nunca mais saiu de lá.

— Mãe, é só uma fase — dizia-me ele ao telefone, tentando soar convincente.

Mas eu via-o definhar. Chegava a casa tarde, cansado, muitas vezes sem vontade de brincar com o pequeno Miguel. A Sofia parecia cada vez mais distante. E os sogros… esses faziam questão de controlar tudo: as férias, as festas de aniversário do neto, até as refeições de domingo eram decididas por eles.

Uma noite, ouvi-o chorar no corredor. O meu António, aquele rapaz forte que sempre enfrentou tudo com um sorriso, chorava baixinho para não acordar ninguém. O meu coração partiu-se em mil pedaços.

Foi aí que decidi: não podia ficar calada.

No sábado seguinte, fui até à casa deles sem avisar. O senhor Manuel abriu a porta com ar surpreendido.

— D. Teresa? Que surpresa…

— Precisamos de falar — disse-lhe, sem rodeios.

Entrámos para a sala. A Sofia apareceu logo a seguir, nervosa. O António ficou parado à porta da cozinha, como se quisesse desaparecer.

— Eu sei o que têm feito ao meu filho — comecei, sentindo as lágrimas ameaçarem cair. — Sei que o pressionam, que o fazem sentir-se menos do que é. Ele não é vosso empregado nem vosso boneco!

O senhor Manuel riu-se.

— D. Teresa, não exagere. O António é como um filho para nós.

— Então tratem-no como tal! — gritei. — Ele está infeliz! Não vêem?

A dona Graça levantou-se do sofá.

— A senhora não tem nada que se meter na nossa família!

— Ele é meu filho! — respondi, já sem conseguir controlar as lágrimas. — E eu não vou permitir que continuem a manipulá-lo!

O António tentou intervir:

— Mãe… por favor…

Mas eu já não conseguia parar.

— Ou deixam o António viver a vida dele ou eu própria trato de o tirar daqui!

O silêncio caiu como uma pedra. Senti-me ridícula e poderosa ao mesmo tempo. A Sofia chorava baixinho; o senhor Manuel olhava-me como se eu fosse louca; a dona Graça abanava a cabeça em desaprovação.

Saí dali sem olhar para trás.

Nos dias seguintes, o António quase não me falou. A Sofia deixou de me atender o telefone. Senti-me sozinha, culpada… mas também aliviada por finalmente ter dito tudo o que me sufocava há tanto tempo.

As semanas passaram e as coisas mudaram pouco. O António continuava preso àquela família que não era dele; eu continuava à margem, proibida de ver o neto durante semanas inteiras. A minha casa ficou mais vazia do que nunca.

Uma tarde chuvosa, o António apareceu à minha porta.

— Mãe…

Abraçou-me como quando era pequeno e chorou no meu ombro.

— Não sei o que fazer — confessou ele. — Sinto-me preso… mas tenho medo de perder tudo: a Sofia, o Miguel…

Abracei-o com força.

— Só tu podes decidir o que é melhor para ti, filho. Mas lembra-te: ninguém tem o direito de te fazer sentir menos do que és.

Ele ficou ali muito tempo em silêncio. Depois levantou-se e foi embora.

Hoje escrevo estas palavras sem saber se fiz bem ou mal. A relação com os sogros do António nunca mais foi a mesma; com a Sofia está tensa; com o meu neto vejo-o menos do que gostaria. Mas pelo menos sei que tentei defender o meu filho quando ele mais precisava.

Às vezes pergunto-me: teria sido melhor calar-me? Ou será que todas as mães devem lutar pelos filhos até ao fim? E vocês? O que fariam no meu lugar?