Quando a Verdade Dói Mais que a Mentira: O Dia em que Descobri a Traição do Meu Marido
— Não faças essa cara, Mariana. Não é nada do que estás a pensar. — A voz do Rui ecoava pela cozinha, mas eu já não conseguia ouvir nada para além do zumbido nos meus próprios ouvidos.
O meu coração batia tão forte que parecia querer saltar-me do peito. As palavras da Ana, a minha suposta amiga e colega de trabalho do Rui, ainda ressoavam na minha cabeça: “Desculpa, mas achei que devias saber. Toda a gente comenta no escritório. O Rui e a Sílvia… já dura há meses.”
Como é que eu não vi? Como é que todos sabiam, menos eu? Senti-me ridícula, uma personagem secundária na minha própria vida. Olhei para o Rui, olhos vermelhos de raiva e vergonha.
— Então diz-me tu, Rui. Diz-me o que é isto! — atirei-lhe com o telemóvel para cima da mesa, onde as mensagens entre ele e a Sílvia brilhavam no ecrã. Palavras doces, promessas, risos cúmplices. Tudo aquilo que ele já não tinha comigo há tanto tempo.
Ele baixou os olhos, as mãos trémulas. — Mariana… Eu… Não sei o que dizer.
— Não sabes? — gritei. — Eu também não sei como é que vou olhar para ti outra vez!
A nossa filha, a Matilde, entrou na cozinha nesse momento, olhos arregalados. — Mãe? O que se passa?
Ajoelhei-me ao lado dela, tentando controlar as lágrimas. — Nada, querida. Vai para o teu quarto, está bem?
Ela hesitou, mas obedeceu. Assim que ouvi a porta fechar-se, desabei. Sentei-me no chão frio da cozinha e chorei como nunca tinha chorado na vida. O Rui ficou ali parado, sem saber o que fazer.
Durante dias, vivi num nevoeiro. A vergonha era insuportável. No supermercado, sentia os olhares das vizinhas; no café, os sussurros atrás das costas. “Coitada da Mariana… toda a gente sabia menos ela.” Até a minha mãe me ligou, voz carregada de preocupação:
— Filha, queres vir cá jantar? Não devias ficar sozinha.
Mas eu não queria ver ninguém. Não queria ouvir conselhos nem palavras de pena. Queria apenas desaparecer.
O Rui tentou falar comigo várias vezes. Mandava mensagens, deixava bilhetes pela casa. “Desculpa.” “Amo-te.” “Foi um erro.” Mas cada palavra dele era como sal nas feridas.
Uma noite, depois de deitar a Matilde, sentei-me na sala escura e ouvi-o entrar devagarinho.
— Mariana… podemos falar?
Olhei para ele, cansada.
— Fala.
Ele sentou-se à minha frente, olhos vermelhos.
— Eu estraguei tudo. Não tenho desculpa. A Sílvia… foi uma estupidez. Eu sentia-me sozinho, tu estavas sempre tão cansada com o trabalho e a Matilde… Eu fui um cobarde.
Ri-me amargamente.
— E eu? Achas que não me sentia sozinha? Achas que não estava cansada? Mas nunca me passou pela cabeça trair-te!
Ele chorou. Pela primeira vez em anos, vi o Rui chorar como uma criança perdida.
— Eu amo-te, Mariana. Quero tentar outra vez. Por favor.
Fiquei ali sentada, sem saber o que dizer. Parte de mim queria abraçá-lo, lembrar-se dos tempos em que éramos felizes. Mas outra parte gritava para fugir dali, para nunca mais confiar nele.
No dia seguinte, fui trabalhar como um autómato. No escritório, os olhares eram ainda mais intensos. A Sílvia evitava cruzar-se comigo nos corredores. A Ana tentou aproximar-se:
— Mariana… desculpa ter sido eu a contar-te…
Afastei-a com um gesto seco.
— Não quero falar sobre isso.
À noite, liguei à minha irmã mais velha, a Teresa. Sempre foi a minha confidente.
— O Rui traiu-me com uma colega do trabalho dele. Toda a gente sabia menos eu.
Do outro lado da linha, silêncio.
— Mariana… queres vir cá passar uns dias? Trazes a Matilde. Vais precisar de tempo para ti.
Aceitei sem pensar duas vezes. Fiz as malas à pressa e fui para casa da Teresa em Cascais. Lá chorei tudo outra vez, mas pelo menos sentia-me protegida.
A Matilde percebeu logo que algo estava errado.
— Mãe… o pai vai voltar para casa?
Não soube responder-lhe. Como explicar a uma criança de sete anos que o pai dela partiu o coração da mãe?
Os dias passaram devagar. O Rui ligava todos os dias para falar com a Matilde e tentava falar comigo também.
— Mariana… por favor… deixa-me explicar…
Desligava-lhe sempre o telefone na cara.
Uma noite, depois de adormecer a Matilde no quarto da prima, sentei-me na varanda com a Teresa.
— O que é que eu faço agora? — perguntei-lhe em lágrimas.
Ela abraçou-me.
— Só tu podes decidir se consegues perdoar ou não. Mas lembra-te: não tens de ter vergonha de nada disto. A vergonha é dele.
Mas eu sentia vergonha. Vergonha por ter confiado demais, por não ter visto os sinais, por ser a última a saber.
Depois de duas semanas fora de casa, voltei finalmente ao nosso apartamento em Lisboa. O Rui estava lá à minha espera, sentado no sofá com ar miserável.
— Mariana… — começou ele assim que entrei.
Levantei a mão para o calar.
— Preciso de tempo. Não sei se algum dia vou conseguir perdoar-te. Mas temos uma filha juntos e isso nunca vai mudar.
Ele assentiu em silêncio.
Os meses seguintes foram um inferno silencioso. Vivíamos juntos por causa da Matilde, mas éramos dois estranhos debaixo do mesmo teto. Às vezes apanhava-o a olhar para mim com tristeza; outras vezes era eu quem chorava sozinha na casa de banho para ninguém ouvir.
A família pressionava-me:
— Mariana, pensa bem antes de tomares uma decisão definitiva — dizia a minha mãe.
— Ele arrependeu-se mesmo — dizia o meu sogro.
Mas ninguém sabia o que era acordar todos os dias com aquele peso no peito.
Um dia, ao buscar a Matilde à escola, encontrei a Sílvia à porta do colégio. Ela olhou para mim com ar culpado e aproximou-se:
— Mariana… eu queria pedir-te desculpa…
Olhei-a nos olhos e vi ali apenas fraqueza e medo.
— Não tens nada para me dizer — respondi friamente e afastei-me com a Matilde pela mão.
À noite, olhei-me ao espelho durante muito tempo. Quem era aquela mulher de olhos inchados e rosto cansado? Onde estava a Mariana alegre e confiante de outros tempos?
Comecei a sair mais com amigas antigas; inscrevi-me num curso de fotografia; levei a Matilde à praia aos fins-de-semana só nós as duas. Aos poucos fui recuperando pedaços de mim mesma que julgava perdidos para sempre.
O Rui continuava ali, tentando reconquistar-me com pequenos gestos: flores na mesa da cozinha; bilhetes escondidos nos meus livros; jantares preparados quando eu chegava tarde do trabalho.
Mas havia algo partido entre nós que não sabia se alguma vez poderia ser colado outra vez.
Numa noite chuvosa de novembro, sentei-me com ele na sala depois de pôr a Matilde na cama.
— Rui… eu já não sou a mesma pessoa desde aquele dia. Não sei se algum dia vou conseguir confiar em ti outra vez.
Ele olhou para mim com lágrimas nos olhos.
— Eu espero por ti o tempo que for preciso…
Suspirei fundo e olhei pela janela escura da nossa sala pequena em Lisboa.
Será possível reconstruir um amor depois da traição? Ou será que há feridas que nunca saram? E vocês… já passaram por algo assim? Conseguiram perdoar?