Quando a minha sogra decidiu ser mais jovem: Uma história de um experimento infeliz

— Catarina, este creme é mesmo milagroso? — perguntou Dona Amélia, com aquele olhar desconfiado que só as sogras sabem ter. Eu estava a arrumar os produtos novos na prateleira da sala, tentando ignorar o cheiro intenso de perfume barato que ela sempre usava.

— É bom, sim, mas é para o rosto, Dona Amélia. Não é para… — hesitei, mas ela já tinha aberto a tampa e cheirava o creme com curiosidade.

— Para o rosto, para o rosto… Isso é tudo marketing! Aposto que faz maravilhas no cabelo também. Olha para este meu cabelo seco, Catarina! — Ela puxou uma madeixa grisalha e abanou-a à minha frente. — Se isto me deixar dez anos mais nova, até te compro dois frascos!

Sorri, sem vontade. O meu marido, Rui, estava na cozinha a fingir que não ouvia nada. Desde que a mãe veio morar connosco, depois do divórcio dela com o sogro, a nossa casa parecia cada vez mais pequena e os meus nervos cada vez mais curtos.

— Dona Amélia, por favor… — tentei avisar, mas ela já estava a esfregar o creme branco nas raízes do cabelo.

— Não sejas tão dramática, menina! — disse ela, rindo-se. — Se isto correr mal, amanhã vou ao cabeleireiro e pronto!

Naquela noite, tentei esquecer o episódio. Mas acordei às três da manhã com gritos vindos da casa de banho.

— Catarina! Rui! Socorro!

Corri pelo corredor, tropeçando nos chinelos do Rui. Encontrei Dona Amélia em frente ao espelho, os olhos arregalados de terror. O cabelo dela estava… verde. Não um verde bonito, mas um tom estranho, entre o musgo e o mofo.

— O que é isto? O que me fizeste? — gritou ela para mim, como se eu tivesse sido a responsável.

— Eu avisei que era só para o rosto! — defendi-me, mas ela não quis saber.

O Rui entrou logo a seguir, ainda meio a dormir.

— Mãe, o que se passa?

— Olha para mim! Pareço uma bruxa! — choramingou ela.

O drama estava instalado. No dia seguinte, Dona Amélia recusou-se a sair do quarto. Faltou à aula de hidroginástica e cancelou o almoço com as amigas. Eu sentia-me culpada, mas também irritada: porque é que nunca me ouvia?

Durante dias, a tensão foi crescendo. O Rui tentava apaziguar as coisas:

— Catarina, ela está envergonhada. Dá-lhe tempo…

Mas eu já não aguentava mais aquela casa cheia de silêncios e olhares acusadores. No trabalho, as colegas riam-se quando contei a história.

— A tua sogra é mesmo personagem! — dizia a Ana Paula.

Mas para mim não tinha graça nenhuma. A Dona Amélia começou a implicar com tudo: o jantar estava salgado, o chão mal limpo, até o cheiro do meu perfume era motivo de crítica.

Uma noite, depois de um jantar particularmente tenso, ela explodiu:

— Sabes qual é o teu problema, Catarina? Achas que és melhor do que eu só porque vendes cremes caros! Mas olha para mim agora! Fui confiar em ti e olha no que deu!

O Rui tentou intervir:

— Mãe, chega! A culpa não é da Catarina!

Mas ela ignorou-o e continuou:

— Sempre foste assim, Catarina. Desde que casaste com o meu filho achas que mandas nesta casa!

Senti as lágrimas a subir-me aos olhos. Levantei-me da mesa e fui fechar-me no quarto. O Rui veio ter comigo pouco depois.

— Desculpa… Ela está frustrada. Sente-se velha e sozinha desde o divórcio. Não é justo para ti…

— Eu sei — respondi baixinho. — Mas não posso ser sempre eu a ceder.

Na manhã seguinte, Dona Amélia apareceu na cozinha com um lenço colorido na cabeça.

— Vou ao cabeleireiro. Não esperem por mim para almoçar.

Saiu sem olhar para trás. Senti um alívio enorme, mas também uma tristeza funda. Afinal de contas, ela era família.

Nesse dia recebi uma mensagem dela: “Obrigada pelo creme. Afinal serviu para alguma coisa: obrigou-me a mudar.”

Quando voltou do cabeleireiro, trazia o cabelo curto e pintado de castanho escuro. Parecia outra pessoa.

— Ficas bem assim — disse-lhe timidamente.

Ela sorriu pela primeira vez em semanas.

— Às vezes precisamos de um desastre para mudar aquilo que não temos coragem de mudar sozinhas.

A partir desse dia, as coisas melhoraram devagarinho. Nunca mais falou do creme nem do cabelo verde. Mas eu aprendi uma lição: há feridas antigas que nenhum creme pode curar.

Agora olho para trás e pergunto-me: quantas vezes tentamos resolver os nossos medos com soluções rápidas? E será que ouvimos realmente quem está ao nosso lado? Gostava de saber se alguém já passou por algo assim…