Preso na Teia: Como Ajudar o Meu Filho e a Nora Me Custou a Liberdade Financeira

— Mãe, não tens noção do que está a acontecer! — O telefone quase tremia na minha mão com o desespero do Tomás. O relógio marcava quase meia-noite, e eu já estava deitada, mas o sono fugiu-me assim que ouvi a voz do meu filho.

— O que foi agora, filho? — perguntei, tentando manter a calma, mas o coração já batia descompassado. Desde pequeno que Tomás era o centro do meu mundo. Depois de perder o pai dele num acidente de viação quando ele tinha apenas sete anos, jurei a mim mesma que nunca lhe faltaria nada. Trabalhei em dois empregos, fiz serões a costurar para fora, e nunca me queixei. Mas agora, aos 62 anos, sentia-me cansada. Achava que finalmente podia respirar, viver um pouco para mim.

— A Rita perdeu o emprego. E eu… — ouvi-o engolir em seco — fui despedido hoje. Não sei o que vamos fazer. O banco já ameaçou com a casa…

Senti um aperto no peito. A Rita era a mulher dele há três anos, uma rapariga doce mas ansiosa, sempre preocupada com tudo. Tinham comprado um apartamento em Almada há pouco mais de um ano. Eu avisei-os: “Não se metam em dívidas grandes, os tempos estão difíceis.” Mas quem é que ouve uma mãe?

— Calma, Tomás. Vamos pensar juntos — disse-lhe, tentando soar firme.

Mas por dentro, só me apetecia chorar. Eu própria vivia com uma reforma pequena e uns trocos das limpezas que ainda fazia em duas casas. Mas como podia virar as costas ao meu filho?

No dia seguinte, sentei-me à mesa da cozinha com uma folha e uma caneta. Fiz contas e mais contas. Liguei ao banco, pedi informações sobre um empréstimo pessoal. Sabia que era arriscado, mas não suportava a ideia de os ver perder tudo.

Quando lhes contei o que ia fazer, a Rita chorou e abraçou-me com força.

— Maria, não sei como agradecer… — disse ela entre soluços.

Tomás olhou-me nos olhos, envergonhado.

— Mãe… não devias fazer isto por nós.

— Sou tua mãe. Não há nada que não fizesse por ti.

Assinei os papéis do empréstimo com as mãos a tremer. O gerente do banco olhou-me com pena.

— Tem a certeza, Dona Maria? Isto vai apertar-lhe muito o orçamento…

— Tenho — respondi, sem hesitar.

Nos primeiros meses, tudo parecia acalmar. Tomás arranjou um trabalho temporário numa loja de informática; Rita começou a dar explicações de inglês. Mas as prestações do empréstimo eram pesadas. Eu deixei de ir ao café com as amigas, cortei nos medicamentos para a tensão alta e comecei a comprar comida mais barata.

Certa noite, ouvi-os discutir na sala enquanto eu lavava a loiça.

— Não aguentas mais? Achas que eu aguento? — gritava Rita.

— Eu estou a fazer o melhor que posso! — respondeu Tomás, exausto.

Fiquei parada à porta da cozinha, sem saber se devia intervir. Senti-me invisível e inútil. Era como se todo o meu esforço não chegasse nunca.

O tempo foi passando e as coisas pioraram. O trabalho do Tomás acabou; Rita perdeu metade dos alunos porque os pais não conseguiam pagar as explicações. As prestações começaram a atrasar-se. O banco ligava-me todos os dias.

Uma tarde, enquanto limpava uma casa em Cacilhas, senti uma tontura forte. Sentei-me no chão da casa de banho e chorei baixinho. Ninguém sabia o quanto me custava cada euro que entregava ao banco.

Quando cheguei a casa nesse dia, encontrei Tomás sentado à mesa da cozinha com uma carta na mão.

— Mãe… é do tribunal. Vão avançar com a penhora da casa.

Sentei-me à frente dele e olhei-o nos olhos.

— Não faz mal, filho. Vamos encontrar outra solução.

Mas ele explodiu:

— Não faz mal?! Tu já deste tudo por nós! E agora vais perder tudo por nossa causa!

Rita entrou na cozinha nesse momento e começou a chorar descontroladamente.

— Isto é culpa minha! Se eu não tivesse insistido naquela casa…

O ambiente tornou-se insuportável. Durante semanas mal falávamos uns com os outros. Eu sentia-me culpada por não conseguir ajudar mais; eles sentiam-se culpados por me arrastarem para o fundo com eles.

Uma noite, acordei com barulho na sala. Fui ver e encontrei Tomás sentado no sofá às escuras.

— Não consigo dormir — murmurou ele. — Sinto-me um fracasso.

Sentei-me ao lado dele e abracei-o.

— Não és um fracasso. És meu filho e és tudo para mim.

Ele chorou no meu ombro como quando era pequeno e tinha pesadelos.

No mês seguinte, fomos despejados do apartamento deles e voltaram para minha casa em Setúbal. A casa era pequena; os nervos estavam à flor da pele. Rita começou a tomar antidepressivos; Tomás fechou-se cada vez mais no quarto.

As minhas amigas começaram a afastar-se — “A Maria só fala de problemas”, diziam elas umas às outras no café. Eu sentia-me sozinha como nunca antes.

Um dia, depois de mais uma discussão entre eles sobre dinheiro e futuro, perdi as forças e gritei:

— Basta! Eu dei tudo o que tinha! Já não posso mais!

O silêncio caiu pesado na sala. Pela primeira vez vi nos olhos do meu filho algo parecido com raiva — ou talvez fosse apenas desespero.

Naquela noite escrevi uma carta para mim mesma:

“Maria,
Quando é que vais começar a viver para ti? Quando é que vais perceber que não podes salvar toda a gente?”

No dia seguinte fui ao banco pedir ajuda social; procurei apoio psicológico no centro de saúde; comecei a ir às caminhadas organizadas pela junta de freguesia para idosos solitários. Aos poucos fui recuperando algum equilíbrio.

Tomás arranjou um trabalho numa fábrica; Rita começou a trabalhar numa loja de roupa. As coisas melhoraram devagarinho, mas nunca voltaram ao que eram antes.

Hoje olho para trás e pergunto-me: onde está o limite entre amar e anular-se? Será que fiz bem em sacrificar tudo pelo meu filho? Ou será que devia ter pensado mais em mim?

E vocês? Até onde iriam por um filho? Será que o amor de mãe justifica tudo?