O Segredo do Meu Genro: Uma Descoberta Que Mudou Tudo
— Mãe, tens mesmo de mexer nas minhas coisas? — ouvi a voz da minha filha, Inês, ecoar do corredor, carregada de impaciência e um certo nervosismo que nunca lhe conheci.
Estava ajoelhada no chão do quarto de arrumos, rodeada de caixas e sacos que se foram acumulando desde que Inês e o Pedro vieram viver connosco. A promessa era clara: “Só uns meses, mãe, até conseguirmos juntar dinheiro para a nossa casa.” Já lá iam quase dois anos. O pó entranhava-se-me nas mãos e no peito, mas o que mais pesava era aquela sensação de que algo não estava bem. Talvez fosse só o cansaço, ou talvez fosse o silêncio estranho entre eles nas últimas semanas.
— Não estou a mexer em nada teu, filha. Só estou a tentar organizar isto — respondi, tentando manter a voz calma, mas sentindo o coração acelerar sem razão aparente.
Foi então que, ao levantar uma caixa de sapatos velha, ouvi um barulho estranho. Dentro dela, entre papéis amarelados e fotografias antigas, estava um envelope castanho, fechado com fita-cola. O nome do Pedro escrito à mão. Hesitei. Não sou mulher de bisbilhotar a vida dos outros, mas aquele envelope parecia pesar toneladas nas minhas mãos.
— Mãe, deixa isso! — gritou Inês, desta vez mais perto, quase a correr.
Mas já era tarde. O envelope abriu-se com facilidade e o seu conteúdo caiu no chão: vários recibos de transferências bancárias para uma conta desconhecida, cartas com um nome feminino — Sofia Marques — e uma fotografia antiga do Pedro abraçado a uma mulher morena, sorridente, num jardim que não reconheci.
O chão fugiu-me dos pés. Senti-me traída, não só por ele, mas pela própria vida. Como é possível não conhecermos verdadeiramente quem deixamos entrar em casa? O Pedro sempre foi educado, prestável — até demais. Fazia questão de ajudar nas tarefas, elogiava os meus cozinhados, trazia flores à Inês. Mas agora tudo aquilo parecia encenação.
Inês entrou no quarto nesse momento. Os olhos dela fixaram-se nos papéis espalhados pelo chão e depois em mim. O silêncio foi cortante.
— Explica-me isto — pedi, a voz embargada.
Ela caiu de joelhos ao meu lado, as mãos a tremer.
— Mãe… eu… eu sabia que havia alguma coisa. Ele anda estranho há meses. Mas nunca pensei… nunca pensei que fosse isto.
— Quem é esta mulher? — perguntei, mostrando-lhe a fotografia.
Inês ficou branca como a cal. — É… é uma ex-namorada dele. Ele disse-me que já não falavam há anos.
Ouvimos passos apressados no corredor. Era o Pedro. Quando viu o cenário, ficou imóvel à porta.
— O que se passa aqui? — perguntou, tentando soar calmo.
— Tu é que nos vais dizer — respondi eu, sem conseguir esconder a raiva e a desilusão.
O Pedro olhou para Inês e depois para mim. Por um momento pareceu querer inventar uma desculpa qualquer, mas depois baixou os ombros.
— Eu… não sei como explicar. A Sofia… ela está doente. Tem leucemia. Eu sou o único familiar próximo que lhe resta. Tenho ajudado financeiramente porque ela não tem mais ninguém.
O silêncio voltou a instalar-se. Inês chorava baixinho. Eu sentia-me dividida entre a compaixão e a fúria.
— E porque é que nunca disseste nada? Porque é que escondeste tudo isto? — perguntei.
— Porque sabia que não iam entender. Porque tinha medo de perder a Inês. Porque achei que conseguia resolver tudo sozinho…
Aquela noite foi longa. O jantar ficou por fazer; ninguém tinha apetite para comer. O Pedro tentou explicar-se melhor, mas cada palavra parecia afastá-lo ainda mais da minha filha. Inês fechou-se no quarto durante dias. Eu andava pela casa como uma alma penada, tentando perceber onde falhei como mãe — será que devia ter desconfiado antes? Será que devia ter protegido mais a minha filha?
Os dias seguintes foram um desfile de silêncios e olhares evitados. O Pedro continuava a sair cedo e chegar tarde; Inês mal falava comigo. Uma noite, ouvi-a chorar baixinho na casa de banho. Sentei-me à porta e esperei até ela sair.
— Filha… — comecei, mas ela interrompeu-me.
— Mãe, eu não sei o que fazer. Amo-o, mas sinto-me traída. Não é só por ele ajudar outra mulher… é por me ter mentido durante tanto tempo.
Abracei-a com força. Senti o peso do mundo nos ombros dela e nos meus.
No fim de semana seguinte, Pedro pediu para falar connosco as duas na sala. Sentou-se à nossa frente, olhos vermelhos de cansaço.
— Sei que vos magoei muito. Não tenho desculpa para as mentiras. Só vos peço uma coisa: deixem-me ajudar a Sofia até ela ficar melhor ou… até ao fim. Depois disso prometo ser transparente convosco em tudo.
Inês olhou para mim em busca de apoio. Eu não sabia o que dizer. Por um lado compreendia o impulso de ajudar alguém em necessidade; por outro lado, não podia aceitar mentiras dentro da minha própria casa.
— A confiança demora anos a construir e segundos a destruir — disse-lhe eu, sentindo as lágrimas ameaçarem cair outra vez.
Os meses passaram devagar. A relação deles nunca voltou a ser a mesma; havia sempre uma sombra entre eles, uma dúvida constante sobre o futuro. A Sofia acabou por falecer em dezembro desse ano. O Pedro ficou devastado; Inês tentou apoiá-lo, mas percebi que algo se tinha partido dentro dela.
No Natal seguinte, sentámo-nos todos à mesa como se nada tivesse acontecido — mas sabíamos todos que aquela família já não era igual à de antes.
Hoje olho para trás e pergunto-me: quantas famílias vivem com segredos destes escondidos nos cantos da casa? Quantas mães acham que conhecem os genros ou noras e afinal mal sabem quem são? Será possível perdoar verdadeiramente uma traição destas?
E vocês? Já sentiram alguma vez que toda a vossa vida podia mudar por causa de um segredo escondido num envelope?