Fui Visitar o Meu Filho em Lisboa Para Descansar, Mas Acabei a Limpar a Casa: O Roberto e a Leonor Nem Agradeceram
— Mãe, não precisavas de te incomodar com isso — disse o Roberto, sem sequer levantar os olhos do telemóvel, enquanto eu esfregava a bancada da cozinha. O cheiro a gordura antiga misturava-se com o aroma do detergente barato que encontrei debaixo do lava-loiça. Olhei para ele, sentado no sofá, pernas esticadas, como se nada fosse.
Quando decidi vir de Vila Nova de Poiares até Lisboa, imaginei-me sentada na varanda do apartamento deles, a beber um chá quente, a ouvir os carros lá em baixo e a sentir o orgulho de ver o meu filho bem instalado na cidade. Não esperava encontrar a casa num estado lastimável: loiça empilhada há dias, roupa espalhada pelo chão do quarto, pó acumulado nos móveis. A Leonor, a minha nora, estava fechada no quarto, alegando trabalho remoto. Mal me cumprimentou quando cheguei.
— Não te preocupes, mãe — insistiu o Roberto, agora com um tom impaciente. — Nós tratamos disso depois.
Mas eu não conseguia ficar parada. O sentido de dever que sempre me guiou na vida rural não me deixava ignorar aquela desordem. Comecei pela cozinha: lavei panelas com restos de comida seca, limpei o frigorífico onde encontrei iogurtes fora de prazo e legumes podres. O cheiro era nauseabundo. Senti uma pontada de tristeza — como é que o meu filho, que sempre me ajudava a arrumar a casa quando era pequeno, agora vivia assim?
No fim da tarde, Leonor saiu finalmente do quarto. Passou por mim na sala com um ar cansado e disse:
— Olá, D. Teresa. Desculpe não ter vindo antes, mas tive reuniões o dia todo.
Sorri-lhe, tentando esconder o cansaço e a mágoa. — Não faz mal, querida. Só estou a dar uma arrumadela.
Ela assentiu distraída e foi buscar um iogurte ao frigorífico. Nem reparou que já estava limpo.
Ao jantar, sentámo-nos os três à mesa. Eu tinha preparado uma sopa de legumes — como fazia em casa — e um arroz de frango. Eles comeram em silêncio, cada um agarrado ao telemóvel. Tentei puxar conversa:
— Então, Roberto, como vai o trabalho?
Ele encolheu os ombros. — O mesmo de sempre. Muito stress.
Leonor suspirou. — Amanhã tenho de entregar um relatório importante. Se calhar vou trabalhar até tarde.
Senti-me deslocada. Como se fosse uma empregada invisível naquela casa onde só queria ser mãe e sogra.
Na manhã seguinte acordei cedo, como sempre fiz na aldeia. Fui à varanda respirar o ar fresco da cidade — mas só senti o cheiro dos carros e do lixo acumulado na rua. Voltei para dentro e comecei a dobrar roupa. No cesto encontrei meias sujas misturadas com camisas caras do Roberto. Lavei tudo à mão porque a máquina estava avariada.
Quando ele acordou, já passava das dez.
— Mãe… porque é que estás a fazer isso? — perguntou, franzindo o sobrolho.
— Porque precisa de ser feito, filho. E vocês trabalham tanto…
Ele não respondeu. Limitou-se a ir buscar café à cozinha.
Ao terceiro dia senti-me exausta. As costas doíam-me e as mãos estavam gretadas dos detergentes. Sentei-me no sofá e olhei para as fotografias antigas na estante: uma do Roberto em pequeno, no jardim da nossa casa na aldeia; outra do nosso último Natal juntos — todos sorridentes.
— Lembras-te deste Natal? — perguntei ao Roberto quando ele passou pela sala.
Ele olhou de relance para a moldura e murmurou:
— Sim… foi giro.
Senti um nó na garganta. Onde estava o meu filho carinhoso? Onde estava aquela família unida?
Na véspera da minha partida, Leonor saiu do quarto mais cedo e sentou-se ao meu lado.
— D. Teresa… desculpe se não lhe demos muita atenção estes dias. Temos andado mesmo cansados.
Sorri-lhe com esforço. — Eu percebo, querida. Só queria ajudar.
Ela fez um sorriso breve e voltou ao computador.
No dia seguinte fiz as malas em silêncio. O Roberto levou-me à estação de comboios sem dizer grande coisa durante o caminho.
— Obrigado por teres vindo — disse ele finalmente, já no cais.
Olhei para ele nos olhos: — Espero que estejam bem… E que cuidem um do outro.
Ele assentiu e deu-me um beijo apressado na testa antes de desaparecer entre a multidão.
No comboio de regresso à aldeia, olhei pela janela e deixei as lágrimas correrem em silêncio. Senti-me vazia — como se tivesse perdido algo precioso sem saber quando ou como aconteceu.
Será que é assim que as famílias mudam? Será que o amor se perde nas rotinas da cidade? Ou será que fui eu que fiquei para trás?
E vocês… já sentiram que deram tudo por alguém e ficaram sem nada em troca?