Férias em Lisboa: Entre o Amor de Mãe e o Peso da Solidão
— Mãe, podes fazer o jantar hoje? — perguntou o Tiago, sem sequer levantar os olhos do portátil. O som das teclas era o único eco na sala, abafando o meu suspiro. Tinha chegado a Lisboa há dois dias, ansiosa por passar tempo com o meu filho, mas desde então sentia-me como uma sombra na casa dele.
Quando aceitei o convite do Tiago para passar uma semana em sua casa, imaginei passeios pela Baixa, conversas demoradas à mesa e risos partilhados. Em vez disso, dei por mim a dobrar roupa, a limpar migalhas do balcão e a ouvir o silêncio pesado entre nós. O Tiago estava sempre ocupado: reuniões online, telefonemas, mensagens rápidas. Eu tentava não me intrometer, mas sentia-me cada vez mais invisível.
Na primeira noite, preparei o prato favorito dele — bacalhau à Brás. Esperei que dissesse algo, um simples “obrigado, mãe”, mas ele comeu apressado, olhos no telemóvel. — Está bom — murmurou, antes de desaparecer para o quarto. Fiquei sozinha na cozinha, a olhar para os pratos sujos e para as memórias de quando ele era pequeno e me abraçava depois do jantar.
No terceiro dia, decidi sair sozinha. Caminhei até ao Jardim da Estrela, sentindo o cheiro das tílias e ouvindo as gargalhadas de outras famílias. Sentei-me num banco e deixei as lágrimas correrem. Lembrei-me de quando o Tiago era criança e me pedia para brincar com ele no parque. Agora, parecia que eu era apenas uma presença conveniente para manter a casa em ordem.
Ao regressar, encontrei-o ao telefone na varanda. — Sim, mãe está cá… Não, não é incómodo nenhum — disse ele, olhando-me de relance. Senti uma pontada no peito. Era incómodo? Eu só queria estar perto dele.
À noite, tentei conversar. — Tiago, tens estado tão ocupado… Queria tanto passar algum tempo contigo.
Ele suspirou. — Mãe, a minha vida aqui é muito corrida. Não tens de te preocupar comigo. Aproveita para descansar.
Descansar? Como se fosse possível descansar quando tudo em mim gritava por atenção e carinho. Passei a noite em claro, ouvindo os sons da cidade misturarem-se com as minhas dúvidas.
No dia seguinte, a campainha tocou cedo. Era a Ana, namorada do Tiago. Entrou apressada, mal me cumprimentando. — Tiago, esqueceste-te do almoço! — disse ela, entregando-lhe uma marmita.
— Obrigado, amor — respondeu ele, dando-lhe um beijo rápido.
Fiquei ali parada, sentindo-me deslocada na própria família. A Ana olhou para mim e sorriu de forma polida. — A senhora está bem? Precisa de alguma coisa?
— Não, obrigada — respondi, tentando sorrir também.
Quando ficaram sozinhos na sala, ouvi-os discutir baixinho:
— Ela está sempre aqui… Não sei como lidar com isto.
— É só por uns dias — respondeu a Ana.
As palavras deles ecoaram na minha cabeça durante horas. Senti-me como um fardo, alguém que já não tinha lugar na vida do filho.
No fim da semana, decidi ir embora mais cedo. Preparei as malas em silêncio. O Tiago apareceu à porta do quarto:
— Vais já?
— Sim… Acho que é melhor assim. Não quero incomodar.
Ele hesitou antes de me abraçar. O abraço foi breve, quase constrangido.
No comboio de regresso ao Porto, olhei pela janela e deixei as lágrimas caírem livremente. Perguntei-me onde tinha falhado como mãe. Será que dei demais? Será que protegi demais? Ou será que simplesmente chegou o momento em que os filhos deixam de precisar de nós?
Agora escrevo estas linhas com o coração apertado e uma pergunta que não me larga: será que algum dia o amor e o cuidado de uma mãe são realmente reconhecidos? Ou estamos condenadas a sermos invisíveis quando já demos tudo?