Entre o Amor de Mãe e o Medo de Perder um Filho: A História de Maria e a Nora Que Nunca Sonhei Ter

— Não podes continuar assim, Inês! — gritei, já sem conseguir conter a frustração, enquanto ela passava por mim no corredor, com o telemóvel colado ao ouvido e a bebé a chorar no berço.

Ela nem sequer olhou para mim. Limitou-se a revirar os olhos e a fechar-se no quarto. Fiquei ali, parada, com o coração aos saltos e as mãos trémulas. O meu filho, Tiago, estava no trabalho. Mais uma vez, era eu quem ficava a tomar conta da pequena Leonor, enquanto a mãe se perdia nas redes sociais ou nas conversas intermináveis com amigas que nunca vi.

Nunca pensei que a minha vida chegasse a este ponto. Sempre fui uma mulher prática, habituada a resolver problemas sem dramas. Mas desde que Inês entrou na nossa família, tudo mudou. Lembro-me do dia em que Tiago a trouxe cá a casa pela primeira vez. Ela tinha 24 anos, mas parecia uma adolescente: jeans rasgados, unhas pintadas de azul elétrico e um olhar distante, sempre atento ao telemóvel. Mal me cumprimentou, preferindo tirar uma selfie na varanda do que sentar-se à mesa connosco.

— Mãe, dá-lhe tempo — disse-me Tiago nessa noite, quando lhe confessei as minhas preocupações. — Ela é diferente, mas vais ver que é boa rapariga.

Tentei acreditar nele. Afinal, quem sou eu para julgar? Mas os meses passaram e nada mudou. Quando engravidou, pensei que talvez a responsabilidade da maternidade a fizesse crescer. Enganei-me.

No dia em que Leonor nasceu, Inês passou mais tempo a tirar fotos para o Instagram do que a olhar para a filha. Eu estava lá, ao lado dela, tentando ajudar como podia. Mas ela parecia mais preocupada em escolher o filtro certo para as fotos do que em aprender a amamentar.

— Inês, queres que te ajude? — perguntei baixinho, tentando não soar crítica.

— Não preciso — respondeu ela secamente, sem desviar os olhos do ecrã.

As semanas seguintes foram um caos. Tiago trabalhava cada vez mais horas para sustentar a casa e eu acabava por passar os dias entre fraldas e biberões. Inês dormia até tarde e passava as tardes no sofá, com séries americanas e snacks espalhados à volta. Quando Leonor chorava, era eu quem corria para o quarto.

Comecei a sentir-me usada. Mas sempre que tentava falar com Tiago sobre isso, ele defendia-a:

— Mãe, ela está cansada. A maternidade não é fácil.

— Não é fácil para ninguém! — respondi uma vez, já sem paciência. — Mas ela não faz nada! Não é justo!

Ele suspirou e saiu da sala. Senti-me sozinha como nunca antes.

A situação piorou quando Inês começou a sair à noite com as amigas. Deixava Leonor comigo e só voltava de madrugada. Uma noite, decidi confrontá-la:

— Inês, isto não pode continuar! Tens uma filha! Não podes viver como se ainda fosses adolescente!

Ela olhou-me com desdém:

— A minha vida não acabou só porque fui mãe! Preciso de tempo para mim!

— E a Leonor? Não precisa da mãe?

Ela encolheu os ombros e saiu porta fora.

Os vizinhos começaram a comentar. Senti vergonha pela primeira vez na vida. No supermercado, ouvi sussurros:

— Aquela é a mãe do Tiago… A nora dela anda sempre na rua…

Comecei a evitar sair de casa. O meu marido tentava acalmar-me:

— Maria, não te metas tanto na vida deles. O Tiago tem de resolver isto com ela.

Mas como podia ficar calada? Era a minha neta! Era o meu filho! Sentia-me responsável por todos eles.

Uma tarde, depois de mais uma discussão acesa com Inês — desta vez porque ela esqueceu-se de ir buscar Leonor ao infantário — sentei-me sozinha na cozinha e chorei como há muito não chorava. Senti-me derrotada.

No dia seguinte, Tiago chegou mais cedo do trabalho. Encontrou-me sentada à mesa, com os olhos vermelhos.

— Mãe… O que se passa?

Desatei num pranto:

— Não aguento mais! Estou cansada! Sinto que perdi o meu filho… E agora estou a perder também a minha neta!

Ele abraçou-me em silêncio. Pela primeira vez em meses, senti que me ouvia de verdade.

— Eu sei que isto não está fácil — disse ele finalmente. — Mas não sei o que fazer… Tenho medo de perder a Inês se for demasiado duro com ela.

— E se perderes a tua filha? — perguntei-lhe baixinho.

Ele ficou calado muito tempo.

Nos dias seguintes, notei pequenas mudanças. Tiago começou a passar mais tempo em casa e tentou envolver Inês nas rotinas da Leonor. Mas ela continuava distante, ausente.

Uma noite, ouvi-os discutir no quarto:

— Inês, tens de mudar! A Leonor precisa de ti!

— Estou farta desta pressão! Toda a gente espera que eu seja perfeita!

— Ninguém espera perfeição… Só queremos que sejas mãe!

O silêncio caiu pesado sobre a casa.

No dia seguinte, Inês saiu cedo e não voltou durante dois dias. Tiago ficou devastado. Leonor perguntava pela mãe e eu fazia o impossível para preencher aquele vazio.

Quando finalmente regressou, parecia outra pessoa: olhos inchados, cabelo despenteado, roupa amarrotada. Sentou-se à mesa comigo e ficou em silêncio muito tempo antes de falar:

— Maria… Eu não sei ser mãe. Nunca quis isto… Sinto-me perdida.

Fiquei sem palavras. Pela primeira vez vi nela uma fragilidade genuína.

— Ninguém nasce ensinado — disse-lhe suavemente. — Mas fugir não resolve nada. A Leonor precisa de ti… E nós também.

Ela chorou baixinho. Pela primeira vez deixou-se abraçar por mim.

Desde esse dia as coisas começaram lentamente a mudar. Inês aceitou ajuda psicológica e começou a envolver-se mais na vida da filha. Ainda há dias maus — muitos dias maus — mas já consigo ver esperança onde antes só via desespero.

Hoje olho para trás e pergunto-me: onde errei? Fui demasiado dura? Devia ter sido mais compreensiva? Ou será que há situações em que o amor simplesmente não chega?

E vocês? O que fariam no meu lugar? Como se explica a alguém que ser mãe é muito mais do que um título — é uma escolha diária?