Depois da Traição da Minha Nora, Ela Já Não É Bem-vinda na Minha Casa

— Não achas que já chega, Mariana? — perguntei, tentando manter a voz firme, mas sentindo o coração a bater descompassado no peito. O silêncio que se seguiu à minha pergunta foi tão pesado que quase podia ouvi-lo a ecoar pelas paredes da sala. O cheiro do arroz de pato ainda pairava no ar, mas ninguém parecia ter apetite depois do que acabara de acontecer.

Tudo começou naquela noite de sábado, quando decidi reunir a família para celebrar o aniversário do meu marido, António. A mesa estava posta com esmero, os copos brilhavam sob a luz quente do candeeiro, e as conversas fluíam entre risos e pequenas picardias. Mariana, a namorada do meu filho mais velho, Pedro, estava sentada ao meu lado. Sempre achei-a reservada, mas educada. Nunca imaginei que aquela noite mudaria tudo.

No meio de uma conversa sobre o novo vizinho do terceiro andar, Mariana interrompeu com um sorriso estranho:

— Sabiam que o Sr. Joaquim foi despedido do banco por causa de um desfalque? — disse ela, olhando diretamente para mim. — E que a Dona Lurdes anda a sair com o marido da prima Rosa?

O choque foi imediato. Vi os olhos da minha cunhada abrirem-se de espanto, enquanto o meu marido largava o talher no prato. Pedro tentou intervir:

— Mariana, não é altura para…

Mas ela continuou, como se tivesse guardado aquelas informações durante meses à espera do momento certo para as libertar.

— E já agora, mãe — disse ela, olhando-me nos olhos —, sabia que o António tem jogado às escondidas com o dinheiro da reforma? E que a Teresa pediu dinheiro emprestado ao vizinho porque não queria contar ao marido?

A sala ficou gelada. Senti-me nua, exposta diante de todos. Como é que ela sabia de tudo aquilo? E porquê agora?

— Mariana, chega! — gritei, incapaz de me controlar.

Ela pousou o copo de vinho e olhou para mim com uma calma assustadora.

— Só achei que era altura de sermos honestos uns com os outros. Afinal, somos família, não somos?

O Pedro levantou-se de rompante.

— Mariana, vamos embora.

Ela hesitou por um segundo, mas acabou por se levantar também. Antes de sair, virou-se para mim:

— Talvez seja melhor assim. Pelo menos agora ninguém tem de fingir.

Quando a porta se fechou atrás deles, senti as pernas fraquejarem. O António aproximou-se e tentou abraçar-me, mas afastei-o sem querer.

— Como é que ela sabia disto tudo? — perguntei em voz baixa.

Ninguém respondeu. A Teresa chorava baixinho na ponta da mesa e a minha cunhada olhava para o prato como se esperasse encontrar ali uma explicação.

Naquela noite não dormi. Revirei-me na cama, a mente cheia de perguntas e mágoas. O Pedro não atendeu as minhas chamadas. No dia seguinte, tentei falar com ele na esperança de perceber o que se passava.

— Mãe, a Mariana é assim — disse ele ao telefone, com voz cansada. — Ela não gosta de segredos nem de hipocrisias.

— Mas isto não se faz! Ela destruiu a nossa família numa noite!

— Talvez só tenha mostrado o que estava mal escondido — respondeu ele antes de desligar.

Durante dias vivi num estado de ansiedade constante. Os vizinhos começaram a olhar para mim de lado no elevador. A Dona Lurdes deixou de me cumprimentar no café e até o Sr. Joaquim evitava cruzar-se comigo no corredor. Senti-me isolada na minha própria casa.

O António tentava minimizar:

— Isto passa. As pessoas esquecem-se rápido.

Mas eu sabia que não era verdade. As palavras da Mariana tinham deixado marcas profundas.

O pior foi quando percebi que o Pedro continuava com ela. Um dia apareceu cá em casa para buscar umas coisas e eu não consegui conter-me:

— Se ela voltar a pôr os pés nesta casa, eu saio!

Ele olhou para mim com uma tristeza nos olhos que me desarmou.

— Mãe, ela é a mulher que eu amo.

— E eu sou tua mãe! — respondi num tom mais alto do que queria.

Ele saiu sem dizer mais nada.

Os dias foram passando e a distância entre nós aumentava. O António tentava ser mediador, mas eu sentia-me traída por todos: pela Mariana por expor os nossos segredos; pelo Pedro por escolher ficar ao lado dela; até pela Teresa por me esconder coisas.

Uma tarde, recebi uma mensagem da Mariana:

“Se quiser conversar, estou disponível.”

Apaguei-a sem responder. Não queria ouvir justificações nem pedidos de desculpa.

No entanto, as palavras dela ecoavam na minha cabeça: “Talvez só tenha mostrado o que estava mal escondido.” Será que estávamos todos apenas a fingir? Será que a nossa família era assim tão frágil?

O tempo passou e as feridas começaram a cicatrizar à superfície, mas por dentro continuava tudo desfeito. O Pedro deixou de vir aos almoços de domingo. A Teresa afastou-se ainda mais. O António tornou-se mais calado.

Um dia, ao arrumar fotografias antigas, encontrei uma imagem do Pedro em pequeno, sentado ao colo do pai no jardim da casa dos meus pais. Lembrei-me dos tempos em que tudo parecia mais simples e seguro. Senti uma saudade profunda daquilo que fomos antes dos segredos e das traições.

Pergunto-me muitas vezes se fiz bem em afastar a Mariana da nossa vida. Será que proteger a família significa esconder verdades dolorosas? Ou será que só assim podemos reconstruir alguma coisa?

E vocês? O que fariam no meu lugar? Será possível perdoar uma traição destas ou há limites que nunca devemos ultrapassar?