A Nora Que Mudou a Minha Vida: Entre Conflitos e Descobertas

— Tiago, não achas que já chega? — perguntei, a voz trémula de indignação, enquanto o via de avental, a esfregar o chão da cozinha. — A Mariana não te vai ajudar?

Ele suspirou, sem me olhar nos olhos. — Mãe, por favor, não comeces outra vez. A Mariana está cansada do trabalho. Eu faço isto porque quero.

Quero? Desde quando o meu filho, que sempre detestou tarefas domésticas, quer limpar a casa inteira sozinho? Senti o sangue ferver-me nas veias. Desde que casou com a Mariana, tudo mudou. Ele já não vinha aos almoços de domingo, já não me ligava para saber como estava. E agora, sempre que o visitava, era ele quem cozinhava, limpava, tratava da roupa. Mariana estava sempre sentada no sofá, com o portátil ao colo ou a ver televisão.

A primeira vez que reparei nisto foi há cerca de um ano. Tinha ido lá levar um bolo de laranja — o preferido dele — e encontrei-o a passar a ferro. Mariana nem se mexeu para me cumprimentar. Senti-me invisível. E pior: senti que ela estava a transformar o meu filho num criado.

— Tiago, não é normal — insisti. — O teu pai nunca fez metade do que tu fazes aqui em casa.

Ele pousou o ferro e olhou-me com uma expressão cansada. — Mãe, os tempos mudaram. Aqui em casa dividimos as tarefas conforme podemos. A Mariana trabalha muito mais horas do que eu.

Mas eu não conseguia aceitar. Cresci numa casa onde o meu pai era o chefe, a minha mãe cuidava de tudo e nós, filhos, ajudávamos quando podíamos. Sempre achei que era assim que as coisas deviam ser. Agora, ver o meu filho submisso à vontade de uma mulher… Doía-me.

Comecei a falar com as minhas amigas sobre isto. A Teresa dizia-me: — Olha que as mulheres de hoje são muito diferentes! — Mas eu via nos olhos dela a mesma preocupação que sentia. A minha irmã, Lurdes, foi mais direta: — Não te metas, Ana. Vais perder o teu filho.

Mas como podia não me meter? Era o meu filho! E eu sentia-o cada vez mais distante.

Um dia, decidi confrontar Mariana diretamente. Esperei até Tiago sair para ir ao supermercado e sentei-me ao lado dela no sofá.

— Mariana, posso falar contigo?

Ela tirou os olhos do telemóvel e olhou-me com um ar aborrecido.

— Claro, diga.

— Não achas que estás a abusar do Tiago? Ele faz tudo em casa…

Ela sorriu, mas foi um sorriso frio.

— Dona Ana, eu trabalho doze horas por dia no hospital. O Tiago está em teletrabalho e tem horários flexíveis. Ele gosta de cuidar da casa e de mim. Se tem algum problema com isso, fale com ele.

Fiquei sem palavras. Nunca ninguém me tinha falado assim. Senti-me humilhada na minha própria família.

Saí dali furiosa e chorei no carro durante meia hora antes de conseguir conduzir para casa.

Durante semanas evitei ir lá. O Tiago ligava-me menos vezes e quando ligava era sempre apressado. Senti um vazio enorme. O meu marido dizia-me para deixar andar, mas eu não conseguia.

No Natal desse ano, insisti para fazerem a consoada em minha casa. Eles aceitaram, mas chegaram atrasados e Mariana passou o jantar inteiro calada, mexendo no telemóvel por baixo da mesa. Quando lhe pedi para ajudar a levantar a mesa, ela disse apenas:

— Desculpe, Dona Ana, estou exausta.

O Tiago levantou-se imediatamente e fez tudo sozinho.

Depois disso, comecei a evitar Mariana sempre que podia. Mas sentia falta do meu filho. Um dia, decidi aparecer lá sem avisar. Encontrei-o sentado à mesa da cozinha com uma expressão derrotada.

— O que se passa? — perguntei.

Ele olhou para mim com os olhos vermelhos.

— Mãe… Eu estou cansado. Sinto que nunca faço nada bem feito. A Mariana está sempre stressada com o trabalho e descarrega em mim. Eu tento ajudar mas parece que nunca chega…

Senti uma pontada no peito. Afinal ele não estava feliz.

— Porque não falas com ela?

Ele encolheu os ombros.

— Já tentei. Ela diz que está tudo bem, mas depois fecha-se no quarto durante horas ou sai sem dizer nada.

Nesse momento percebi que tinha julgado mal a situação. Não era só ela a culpada; havia algo mais profundo ali. Talvez fosse depressão, talvez fosse apenas cansaço extremo… Mas percebi que o meu filho precisava de mim de outra forma.

Comecei a ir lá mais vezes, mas sem críticas nem acusações. Levava comida feita, ajudava nas limpezas quando podia e tentava conversar com Mariana sobre outros assuntos que não fossem tarefas domésticas.

Aos poucos ela foi-se abrindo comigo. Um dia contou-me que tinha perdido um bebé há dois anos e nunca tinha conseguido falar sobre isso com ninguém.

— Sinto-me vazia desde então — confessou-me entre lágrimas na varanda do apartamento deles. — O Tiago tenta ajudar mas eu sinto raiva dele por não sentir a mesma dor…

Nesse momento abracei-a como se fosse minha filha.

A partir daí tudo mudou entre nós. Começámos a falar mais abertamente sobre sentimentos e dificuldades. O Tiago procurou ajuda psicológica e Mariana também começou terapia.

Hoje olho para trás e percebo como fui injusta ao julgar só pelo que via à superfície. A vida é muito mais complexa do que as aparências mostram.

Às vezes pergunto-me: quantas famílias se destroem por falta de diálogo e compreensão? E quantas mães perdem os filhos por medo de mudar?

E vocês? Já passaram por algo assim? Como lidaram com os vossos próprios preconceitos?