A Convidada Indesejada: O Peso de Uma Sogra em Minha Vida
— Não entras aqui, Lídia! — gritei, com a voz a tremer, enquanto segurava a porta com toda a força que tinha. O cheiro do perfume dela já invadia o corredor, misturado com o aroma do café acabado de fazer. — Esta é a minha casa! — insisti, mas ela, com aquele olhar frio e superior, respondeu:
— A casa é do meu filho, Vitória. E enquanto ele quiser, eu entro quando bem entender.
Ouvia-se o barulho das chaves dela a tilintar no bolso do casaco. Eu sabia que ela tinha uma cópia, feita às escondidas, e isso fazia-me sentir invadida até ao mais íntimo do meu ser. O Bryan, meu marido, estava no trabalho. Eu estava sozinha para enfrentar aquela mulher que nunca me aceitou.
Desde o início do nosso namoro, Lídia fez questão de mostrar que eu não era suficiente para o filho dela. “Uma rapariga de Lisboa? Não sabes cozinhar como as mulheres da nossa terra!” — dizia ela, sempre com aquele tom de desdém. Bryan tentava apaziguar as coisas, mas acabava sempre por ceder à mãe. “Ela só quer ajudar”, dizia ele. Mas eu sabia que era mais do que isso.
A primeira vez que Lídia entrou sem avisar foi logo depois do nosso casamento. Cheguei a casa e encontrei-a na cozinha, a mexer nas minhas panelas, a criticar a arrumação dos armários.
— Isto está tudo fora do sítio! Como é que consegues viver assim? — perguntou, sem sequer me olhar nos olhos.
Tentei respirar fundo e manter a calma. Mas cada visita dela era um teste à minha sanidade. Comecei a evitar estar em casa sozinha. Ia ao café da esquina, ficava horas a passear pelo bairro só para não ter de enfrentar aquela presença sufocante.
Um dia, depois de mais uma discussão acesa, Bryan chegou a casa e encontrou-me sentada no chão da sala, a chorar.
— O que se passa, amor? — perguntou ele, preocupado.
— Não aguento mais! Ou ela ou eu! — gritei, sem conseguir controlar as lágrimas.
Ele ficou em silêncio. O silêncio dele doeu mais do que qualquer palavra da mãe dele. Senti-me sozinha, traída por quem devia proteger-me.
As semanas seguintes foram um inferno. Lídia começou a aparecer cada vez mais cedo, como se quisesse apanhar-me desprevenida. Uma manhã, acordei com o som da loiça a bater na cozinha. Levantei-me de rompante e encontrei-a a limpar o frigorífico.
— Não tens vergonha? — perguntei-lhe, já sem forças para ser educada.
— Vergonha? Vergonha devia ter tu! A casa está um nojo! — respondeu ela, atirando-me um pano sujo para as mãos.
Senti uma raiva crescer dentro de mim como nunca antes. Liguei ao Bryan e exigi que viesse para casa imediatamente. Quando ele chegou, encontrou-nos às duas aos gritos.
— Chega! — gritou ele. — Isto não pode continuar assim!
Mas nada mudou. Lídia continuava a aparecer, sempre com desculpas novas: “Vim trazer pão fresco”, “Vim ver se precisavam de alguma coisa”. Mas eu sabia que era só para me controlar, para me mostrar quem mandava ali.
A situação piorou quando engravidei. Lídia começou a dizer a toda a gente que ia ser ela a cuidar do bebé porque “a Vitória não sabe nada de crianças”. Senti-me humilhada perante a família toda. A minha própria mãe tentou intervir, mas Lídia era implacável.
No dia em que o meu filho nasceu, Lídia apareceu no hospital antes mesmo do Bryan chegar. Pegou no bebé como se fosse dela e disse:
— Agora sim, esta casa vai ser como deve ser!
Chorei em silêncio naquela noite, sentindo-me uma estranha na minha própria vida.
O tempo passou e o Bryan foi-se afastando de mim. Passava mais tempo com a mãe do que comigo e com o nosso filho. As discussões tornaram-se diárias. Um dia, durante um jantar em família, Lídia disse alto e bom som:
— Se não gostas da minha presença, podes sempre ir embora!
Olhei para o Bryan à espera de uma palavra de apoio. Mas ele desviou o olhar.
Foi nesse momento que percebi que estava sozinha nesta luta. Comecei a procurar trabalho para poder sair daquela casa. Arranjei um emprego numa pastelaria e comecei a juntar dinheiro às escondidas.
Certa noite, depois de mais uma discussão violenta com Lídia — ela tinha mexido nos meus papéis pessoais e espalhado tudo pela sala — decidi que era hora de partir.
Esperei até todos estarem a dormir. Peguei no meu filho ao colo e saí pela porta dos fundos. Fui para casa da minha mãe em Almada. Senti um alívio imediato, mas também um vazio enorme.
Bryan ligou-me no dia seguinte.
— Porque é que foste embora assim? — perguntou ele, magoado.
— Porque nunca me escolheste a mim — respondi-lhe, com lágrimas nos olhos.
Os meses seguintes foram difíceis. Tive de lutar na justiça pela guarda do meu filho. Lídia tentou tudo para me pintar como uma mãe incapaz. Mas eu não desisti. Contei com o apoio da minha família e dos meus amigos.
Hoje vivo sozinha com o meu filho num pequeno apartamento em Almada. Trabalho muito para lhe dar tudo o que posso. Às vezes ainda sonho com aquela casa onde nunca fui feliz.
Pergunto-me muitas vezes: porque é que as pessoas deixam que outros destruam aquilo que têm de mais precioso? Será que algum dia vou conseguir perdoar o Bryan por não ter lutado por nós?
E vocês? Já sentiram que tiveram de fugir para salvar a vossa própria paz?