Quando Disse Não a Miguel e Casei com Rui: Um Reencontro Após 20 Anos

“Por que não podemos simplesmente ser felizes juntos?”, perguntou Miguel, seus olhos azuis fixos nos meus, cheios de esperança e desespero. Eu hesitei, sentindo o peso do mundo em meus ombros. “Miguel, eu preciso de mais do que isso. Preciso de uma vida que me tire daqui, que me leve além das colinas que nos cercam”, respondi, tentando manter a voz firme enquanto meu coração se partia.

Cresci em uma aldeia pequena no interior de Portugal, onde as oportunidades eram tão escassas quanto as chuvas no verão. Meus pais trabalhavam arduamente na terra, mas eu sempre sonhei com algo mais. Desde pequena, prometi a mim mesma que não seguiria o mesmo caminho. Estudei com afinco, ganhei bolsas de estudo e vislumbrei um futuro brilhante longe dali.

Miguel era meu amor de juventude, o rapaz que me fazia rir nos dias mais sombrios e que prometia amor eterno sob as estrelas. Mas quando ele se ajoelhou e me pediu em casamento, tudo o que consegui pensar foi na vida que eu queria construir. “Não posso, Miguel”, disse finalmente, sentindo as lágrimas queimarem meus olhos. “Preciso seguir meu caminho.”

Foi então que conheci Rui. Ele era tudo o que eu achava que precisava: ambicioso, determinado e já com um pé na cidade grande. Casar com Rui parecia a escolha certa para alcançar meus sonhos de uma vida melhor. Deixei Miguel para trás, junto com a aldeia e todas as lembranças de uma juventude cheia de promessas.

Os primeiros anos com Rui foram emocionantes. Mudamo-nos para Lisboa, onde ele tinha um emprego promissor em uma empresa de tecnologia. Eu consegui um trabalho como professora, algo que sempre amei fazer. Tínhamos um apartamento pequeno mas aconchegante, e a cidade parecia cheia de possibilidades.

No entanto, com o passar do tempo, percebi que a ambição de Rui era insaciável. Ele trabalhava longas horas e nossas conversas se tornaram cada vez mais raras. Eu me via sozinha em meio à multidão da cidade grande, sentindo falta da simplicidade e do amor genuíno que deixei para trás.

Os anos passaram rapidamente. Tive dois filhos maravilhosos, Sofia e Tiago, que se tornaram minha razão de viver. Mas meu casamento com Rui tornou-se uma sombra do que eu esperava. Ele estava sempre ausente, tanto física quanto emocionalmente. As discussões eram frequentes e muitas vezes me perguntava se tinha feito a escolha certa.

Foi então que o destino interveio de maneira inesperada. Estava numa conferência educacional em Coimbra quando ouvi uma voz familiar atrás de mim: “Ana?” Virei-me e lá estava ele, Miguel, mais velho mas ainda com aquele mesmo olhar caloroso.

“Miguel! Não acredito! Quanto tempo!”, exclamei, surpresa e nervosa ao mesmo tempo. Conversamos por horas naquele café, relembrando os velhos tempos e compartilhando as voltas que nossas vidas deram.

Miguel contou-me sobre sua vida após minha partida. Ele ficou na aldeia por alguns anos, mas depois decidiu seguir seus próprios sonhos e mudou-se para o Porto, onde abriu uma pequena livraria. “Sempre quis estar rodeado de histórias”, disse ele com um sorriso nostálgico.

Enquanto ele falava, não pude deixar de sentir uma pontada de arrependimento. E se eu tivesse dito sim? E se tivesse escolhido o amor ao invés da ambição? Mas ao mesmo tempo, sabia que não podia mudar o passado.

Miguel também tinha sua própria família agora. Era casado e tinha uma filha chamada Clara. “Ela é a luz da minha vida”, disse ele com orgulho nos olhos.

Nos despedimos prometendo manter contato, mas aquela conversa mexeu comigo de maneiras que eu não esperava. Voltei para Lisboa com o coração pesado e a mente cheia de perguntas sem resposta.

Contei a Rui sobre o encontro com Miguel naquela noite. Ele apenas assentiu distraidamente enquanto verificava seus e-mails no telefone. Foi nesse momento que percebi o quanto estávamos distantes.

Os dias seguintes foram preenchidos por uma reflexão profunda sobre minha vida e minhas escolhas. Será que estava vivendo a vida que realmente queria? Ou estava apenas seguindo um caminho traçado por expectativas alheias?

Finalmente, decidi ter uma conversa franca com Rui. “Precisamos falar sobre nós”, disse-lhe uma noite enquanto jantávamos em silêncio.

“O que há para falar? Estamos bem”, respondeu ele sem levantar os olhos do prato.

“Não estamos bem, Rui. Estamos vivendo como estranhos sob o mesmo teto”, insisti, sentindo a urgência das palavras.

Ele finalmente olhou para mim, surpreso pela minha determinação. “O que você quer fazer?”, perguntou ele.

“Quero encontrar um caminho onde possamos ser felizes novamente ou seguir em frente separadamente”, respondi com sinceridade.

Foi uma conversa difícil, mas necessária. Decidimos tentar terapia de casal para ver se havia algo a ser salvo em nosso relacionamento.

Enquanto isso, continuei trocando mensagens com Miguel ocasionalmente. Ele era um amigo querido agora, alguém que entendia minhas dúvidas e medos sem julgamento.

A terapia trouxe à tona muitas questões não resolvidas entre mim e Rui. Percebi que ambos mudamos ao longo dos anos e talvez não fôssemos mais compatíveis como antes.

Finalmente, após meses de tentativas e reflexões dolorosas, decidimos nos separar amigavelmente. Foi uma decisão mútua e madura, pensando no bem-estar dos nossos filhos acima de tudo.

Hoje estou redescobrindo quem sou fora do casamento e das expectativas impostas por mim mesma há tantos anos atrás. Miguel continua sendo um amigo próximo e um lembrete do que poderia ter sido.

Às vezes me pergunto: será que fiz as escolhas certas? Ou será que o destino sempre nos leva onde precisamos estar? Talvez nunca saiba a resposta exata, mas estou aprendendo a aceitar a incerteza como parte da jornada da vida.