Desmaiei no Aniversário da Minha Mãe Porque o Miguel Não Me Ajudava com o Nosso Bebé – Será Este o Fim da Nossa Família?
— Rita, podes trazer mais guardanapos? — ouvi a voz da minha mãe ecoar da sala, enquanto o cheiro do bacalhau com natas se espalhava pela casa. O meu corpo tremia de cansaço, mas sorri e levantei-me, com o pequeno Tomás ao colo, já a resmungar de sono. Olhei para o Miguel, sentado no sofá com o meu irmão e o meu pai, rindo-se alto de uma piada qualquer. Nem um olhar na minha direção.
Senti uma raiva surda a crescer dentro de mim. Desde que o Tomás nasceu, há três meses, parecia que tudo tinha mudado — menos para o Miguel. Eu era a mãe exausta, de olheiras fundas e camisolas manchadas de leite, enquanto ele continuava a sair com os amigos ao sábado à noite e a dormir até tarde ao domingo. “É só uma fase”, diziam-me. Mas ninguém me dizia quando é que esta fase acabava.
— Rita, estás bem? — perguntou a minha irmã Ana, baixinho, ao ver-me hesitar à porta da cozinha.
— Estou, só preciso de um minuto — murmurei, tentando equilibrar o Tomás e os guardanapos. O suor escorria-me pelas costas. Senti as pernas bambas. O Tomás começou a chorar mais alto e eu tentei embalá-lo, mas as minhas mãos tremiam tanto que quase o deixei cair.
— Miguel! — chamei, num tom mais alto do que queria. — Podes pegar nele um bocadinho?
Ele olhou para mim como se eu tivesse interrompido algo sagrado.
— Agora? Estou a falar com o teu pai sobre futebol… Não podes esperar um bocado?
O meu coração apertou-se. Senti os olhos de toda a família em mim. A minha mãe franziu o sobrolho, mas não disse nada. O meu pai desviou o olhar para a televisão. Só a Ana se aproximou e pegou no Tomás.
— Vai sentar-te um pouco — sussurrou ela. — Estás branca como a cal.
Sentei-me à mesa, mas tudo à minha volta começou a rodar. O barulho das conversas misturava-se com o choro do Tomás e as gargalhadas do Miguel. Senti uma onda de calor subir-me à cabeça e depois… nada.
Acordei deitada no sofá, com toda a família em redor. A minha mãe abanava-me suavemente.
— Rita! Estás bem? Assustaste-nos!
O Miguel estava ali ao lado, mas não me tocava. Tinha uma expressão estranha — entre preocupação e embaraço.
— Foi só cansaço — murmurou ele, quase como se pedisse desculpa pela minha fraqueza.
A vergonha queimava-me por dentro. Queria desaparecer dali. Queria gritar com ele: “Porque é que não me ajudas? Porque é que não vês que estou a afundar-me?” Mas limitei-me a fechar os olhos e fingir que dormia.
Quando finalmente voltámos para casa, o silêncio era pesado. O Tomás dormia no ovo do carro e eu sentia cada músculo do corpo a protestar. O Miguel foi direto para o telemóvel.
— Olha, amanhã vou sair com o Rui depois do trabalho — disse ele, sem me olhar nos olhos.
— Achas mesmo que podes continuar assim? — perguntei, a voz embargada.
Ele encolheu os ombros.
— Rita, tu é que estás sempre cansada… Eu também preciso de descontrair.
As lágrimas caíram-me pela cara sem aviso. Sentei-me no chão da cozinha e chorei como há muito não chorava. Chorei pelo cansaço, pela solidão, pela raiva de ver o homem que amei tornar-se um estranho indiferente à nossa dor.
Naquela noite não dormi. Fiquei sentada ao lado do berço do Tomás, ouvindo-o respirar suavemente. Pensei em tudo o que tinha perdido: as conversas longas com o Miguel antes de adormecermos, os passeios de mão dada ao domingo, os sonhos partilhados sobre a nossa família perfeita.
Agora só havia silêncio e distância.
No dia seguinte tentei falar com ele à mesa do pequeno-almoço.
— Miguel, precisamos mesmo de conversar. Eu não aguento mais assim…
Ele suspirou, irritado.
— Rita, estás sempre a reclamar. Nunca está nada bem para ti! Achas que és a única cansada? Eu também trabalho!
— Mas tu não ajudas em casa! Não ajudas com o Tomás! Eu estou sozinha nisto tudo!
Ele levantou-se bruscamente.
— Se é assim tão mau estar comigo, talvez devesses ir para casa da tua mãe!
As palavras dele cortaram-me como facas. Fiquei ali sentada, sozinha na cozinha, com o som da porta a bater ainda a ecoar nos meus ouvidos.
Durante dias andámos assim: ele ausente ou calado; eu fechada no meu mundo de fraldas e choros e noites sem dormir. A Ana ligava-me todos os dias para saber como estava. A minha mãe mandava mensagens preocupadas: “Precisas de alguma coisa?” Mas eu não queria preocupar ninguém. Sentia vergonha por não conseguir ser aquela mãe feliz das revistas ou dos Instagrams das amigas.
Uma noite, depois de adormecer o Tomás pela terceira vez, sentei-me no sofá e escrevi uma carta ao Miguel. Não tive coragem de lha dar — mas precisava de pôr tudo cá fora:
“Miguel,
Sinto-me invisível ao teu lado. Sinto que perdi quem era e que tu nem reparaste. Preciso de ti — não só como pai do Tomás, mas como companheiro. Preciso que me vejas, que me ouças, que estejas aqui comigo nesta luta diária. Não quero desistir de nós… mas não consigo continuar sozinha.”
Guardei a carta na gaveta da mesa-de-cabeceira e chorei baixinho para não acordar o bebé.
Na semana seguinte foi pior: apanhei uma gripe forte e fiquei mesmo de cama. O Miguel teve de faltar ao trabalho para ficar com o Tomás — pela primeira vez desde que nasceu. No segundo dia entrou no quarto com olheiras profundas e um ar derrotado.
— Como é que tu consegues fazer isto todos os dias? — perguntou ele, quase num sussurro.
Olhei para ele sem saber se devia rir ou chorar.
— Porque não tenho escolha — respondi apenas.
Ele sentou-se ao meu lado e ficou em silêncio muito tempo. Depois pegou na minha mão — gesto raro nos últimos meses — e murmurou:
— Desculpa… Acho que nunca percebi mesmo como era difícil para ti.
Não foi um pedido de desculpas perfeito nem uma promessa de mudança imediata. Mas foi um começo.
Ainda hoje não sei se vamos conseguir salvar o nosso casamento ou se esta ferida nunca vai sarar completamente. Sei apenas que preciso de lutar por mim — pelo meu bem-estar e pelo do Tomás — mesmo que isso signifique tomar decisões difíceis no futuro.
Às vezes pergunto-me: quantas mulheres passam por isto em silêncio? Quantas famílias se desfazem porque ninguém tem coragem de pedir ajuda ou dizer basta?
E vocês? Já sentiram esta solidão dentro da vossa própria casa? O que fariam no meu lugar?