Como a oração salvou o meu casamento e a relação com a minha sogra – Confissão de uma mulher de Braga

— Não és suficiente para o meu filho, Mariana. Nunca foste. — As palavras da Dona Teresa ecoavam na minha cabeça como um trovão, mesmo depois de ela ter saído da sala. O Miguel estava sentado ao meu lado, mas parecia tão distante, perdido entre o amor pela mãe e o compromisso comigo. Eu sentia o peito apertado, as mãos frias, e uma vontade quase incontrolável de gritar. Mas não gritei. Apenas olhei para ele, esperando uma palavra de conforto, um gesto, qualquer coisa.

— Mariana, sabes como ela é… — murmurou ele, evitando o meu olhar. — Não leves a peito.

Como não levar a peito? Desde o início do nosso namoro, Dona Teresa fez questão de mostrar que eu não era bem-vinda na família. “A Mariana não tem classe”, “A Mariana não sabe cozinhar como nós”, “O Miguel merece melhor”. Cada frase era uma facada. E eu, teimosa, achava que com o tempo ela mudaria. Que bastava mostrar-lhe amor e dedicação. Mas os anos passaram e nada mudou. Pelo contrário: quando casámos, as coisas pioraram.

A nossa casa em Braga era pequena, mas cheia de sonhos. O Miguel trabalhava numa empresa de informática e eu dava aulas numa escola primária. Não tínhamos muito dinheiro, mas tínhamos planos: filhos, viagens, domingos em família. Só que Dona Teresa fazia questão de se intrometer em tudo. Ligava todos os dias para saber o que íamos jantar, criticava a decoração da casa, aparecia sem avisar para “ajudar” — mas acabava sempre por apontar defeitos.

Lembro-me de um domingo em particular. Estava a preparar um arroz de pato para o almoço — receita da minha mãe — quando ela entrou pela porta sem bater.

— Arroz de pato? O Miguel nunca gostou disso! — exclamou, franzindo o nariz.

— Gosto sim, mãe — respondeu ele, mas já sem convicção.

Ela ignorou-o e começou a mexer nas panelas, a corrigir-me como se eu fosse uma criança. Senti-me humilhada na minha própria casa. Quando finalmente nos sentámos à mesa, o ambiente estava tão pesado que mal consegui comer.

Depois desse dia, comecei a evitar os almoços de família. Inventava desculpas para não ir a casa dela, pedia ao Miguel para ir sozinho. Mas isso só criou mais distância entre nós. Ele ficava dividido: queria agradar à mãe, mas também não queria magoar-me.

As discussões começaram a ser frequentes. Pequenas coisas tornavam-se grandes tempestades. Uma toalha fora do sítio, um comentário mal interpretado, uma visita inesperada da Dona Teresa — tudo era motivo para brigas.

— Não aguento mais! — gritei uma noite, depois de mais uma discussão sobre a mãe dele. — Sinto-me sozinha neste casamento!

O Miguel olhou para mim com olhos cansados.

— Mariana… eu amo-te. Mas ela é minha mãe.

— E eu? Eu sou tua mulher!

Chorei nessa noite até adormecer. Senti-me derrotada, sem forças para lutar. Pensei em desistir, em fazer as malas e ir embora. Mas algo dentro de mim dizia para ficar. Talvez fosse orgulho, talvez fosse amor. Ou talvez fosse fé.

Foi nessa altura que comecei a rezar com mais intensidade. Não era muito religiosa antes do casamento — ia à missa nos domingos importantes e pouco mais — mas naquele momento agarrei-me à oração como quem se agarra a uma tábua no meio do naufrágio.

Rezava todas as noites antes de dormir. Pedia paciência, sabedoria, força para perdoar. Pedia por mim, pelo Miguel, pela Dona Teresa. Às vezes chorava enquanto rezava; outras vezes sentia uma paz inexplicável.

Certa noite, depois de uma oração especialmente longa, sonhei com a minha avó Maria. Ela sempre dizia: “O perdão é mais para quem perdoa do que para quem é perdoado”. Acordei com essa frase na cabeça e decidi tentar algo diferente.

No domingo seguinte, liguei à Dona Teresa e convidei-a para almoçar cá em casa — só nós as duas.

— O Miguel não vai estar? — perguntou ela desconfiada.

— Não. Quero falar consigo… como mulheres.

Ela aceitou, embora relutante. Passei a manhã nervosa, sem saber como ia ser recebida. Preparei um bolo de laranja — o preferido dela — e pus a mesa com todo o cuidado.

Quando ela chegou, estava tensa, quase hostil.

— Então? — perguntou logo à entrada.

Sentei-me à mesa com ela e respirei fundo.

— Dona Teresa… sei que nunca fui aquilo que sonhou para o seu filho. Sei que temos diferenças e que às vezes magoámo-nos uma à outra. Mas eu amo o Miguel e quero que ele seja feliz — e sei que ele só vai ser feliz se nós conseguirmos dar-nos bem.

Ela ficou calada durante uns segundos eternos.

— Também quero o melhor para ele… — murmurou por fim.

— Então vamos tentar? Por ele? Por nós?

Ela olhou-me nos olhos pela primeira vez em muito tempo. Vi ali dor, orgulho ferido… mas também uma pontinha de esperança.

— Podemos tentar — disse ela baixinho.

Não foi fácil depois disso. Houve recaídas, discussões, silêncios desconfortáveis. Mas comecei a ver pequenas mudanças: um elogio tímido ao meu cozido à portuguesa; um telefonema só para perguntar se estava tudo bem; um convite para ir ao mercado juntas.

O Miguel reparou na diferença e ficou emocionado.

— O que fizeste? — perguntou ele numa noite em que estávamos no sofá.

— Rezei… e tentei perdoar — respondi-lhe com um sorriso cansado.

Com o tempo, a relação foi-se curando. Não nos tornámos melhores amigas de um dia para o outro, mas aprendemos a respeitar-nos e a aceitar as nossas diferenças. O Miguel deixou de andar dividido e passou a sentir-se em paz em casa.

Hoje olho para trás e percebo que a oração não mudou apenas a Dona Teresa — mudou-me a mim também. Deu-me paciência onde antes só havia raiva; deu-me compaixão onde só havia mágoa; deu-me esperança quando tudo parecia perdido.

Às vezes pergunto-me: quantas famílias se destroem por orgulho? Quantos casamentos acabam porque ninguém quer dar o primeiro passo? Se eu não tivesse rezado… se não tivesse tentado perdoar… onde estaria agora?

E vocês? Já passaram por algo assim? O que fariam no meu lugar?