O Segredo Sob o Quarto 12: Uma Noite no Motel da Estrada Nacional

— Madalena, ouve… ouves isto? — sussurrei, com o coração a bater tão forte que quase abafava o som estranho vindo debaixo da cama. O quarto 12 do Motel Estrela do Norte era velho, com cheiro a mofo e cortinas pesadas que não deixavam passar a luz da manhã. Tínhamos decidido fazer uma pausa na viagem até ao Porto, mas aquela noite estava longe de ser tranquila.

Madalena levantou-se devagar, ainda meio sonolenta, e olhou para mim com aquele ar de quem não acredita em nada. — Deixa-te disso, Inês. Deve ser só um rato ou qualquer coisa. — Mas eu sabia que não era. O som era ritmado, como se alguém batesse levemente na madeira.

Aproximei-me da cama, ajoelhei-me e levantei a colcha. O chão debaixo da cama parecia diferente, como se tivesse sido mexido recentemente. Passei os dedos pela madeira e senti uma pequena ranhura. — Ajuda-me aqui! — pedi, já com as mãos a tremer.

Juntas, puxámos uma tábua solta. O cheiro a terra húmida e ferrugem invadiu o quarto. Debaixo da cama havia uma espécie de alçapão improvisado. Madalena olhou para mim, os olhos arregalados. — Achas mesmo que devemos abrir?

— Agora já não há volta a dar — respondi, tentando soar mais corajosa do que me sentia.

Com algum esforço, levantámos a tampa. Uma escada velha descia para uma divisão escura. Peguei no telemóvel e liguei a lanterna. O feixe de luz revelou paredes de pedra e um chão coberto de pó e papéis velhos. Descemos devagar, o silêncio apenas interrompido pelo ranger da escada.

No fundo do alçapão, havia uma caixa de madeira fechada com um cadeado enferrujado. Ao lado, uma fotografia antiga: reconheci imediatamente o meu avô António, ainda jovem, ao lado de um homem desconhecido e… do dono do motel, o Sr. Álvaro.

— Isto é impossível… — murmurei, sentindo um frio na espinha.

Madalena pegou na fotografia e virou-a. No verso, estava escrito: “Nunca deixes que descubram o que fizemos aqui”.

O coração apertou-se-me no peito. O meu avô tinha morrido há anos, mas sempre pairara sobre ele um segredo nunca explicado — aquela noite em que desapareceu durante dois dias e voltou diferente, calado, sombrio.

— Inês, temos de sair daqui — disse Madalena, mas eu não conseguia mexer-me. Precisava de saber o que estava naquela caixa.

Voltámos ao quarto e tentei forçar o cadeado com uma faca do pequeno-almoço. Depois de alguns minutos de luta, o cadeado cedeu com um estalo seco. Dentro da caixa havia cartas antigas, recortes de jornais amarelados e uma pequena pistola enferrujada.

Li uma das cartas em voz alta:

“Álvaro,
Se alguém algum dia encontrar isto, saberá que nunca foi acidente. O segredo do quarto 12 deve morrer connosco. Não posso viver com este peso. — António”

As mãos tremiam-me tanto que quase deixei cair a carta. Madalena olhava para mim em choque.

— O teu avô… ele matou alguém aqui?

— Não sei… — respondi, mas no fundo já suspeitava da verdade. Lembrei-me das discussões entre o meu pai e o Sr. Álvaro quando eu era criança, sempre sobre dinheiro e ameaças veladas.

De repente ouvimos passos no corredor. Alguém batia à porta com força.

— Meninas! Está tudo bem aí dentro? — Era o Sr. Álvaro.

Escondemos rapidamente a caixa e subimos as escadas do alçapão, fechando-o atrás de nós. Abri a porta com um sorriso forçado.

— Está tudo bem, só ouvimos um barulho estranho — disse eu.

O Sr. Álvaro olhou-nos fixamente, os olhos escuros cheios de desconfiança.

— Espero que estejam a gostar da estadia… O pequeno-almoço já está servido lá fora.

Assim que ele se afastou, Madalena agarrou-me pelo braço.

— Inês, temos de ir à polícia!

Mas eu sabia que não era assim tão simples. A minha família estava envolvida nisto até ao pescoço. Se denunciasse o Sr. Álvaro, estaria também a denunciar o meu avô — e talvez até o meu pai.

Passámos o resto da manhã em silêncio, cada uma perdida nos seus pensamentos. Quando finalmente voltámos para Lisboa, levei comigo a caixa e as cartas.

Durante semanas não consegui dormir. O peso daquele segredo era insuportável. Confrontei o meu pai numa noite chuvosa na nossa cozinha:

— Pai… quem era o homem da fotografia?

Ele ficou pálido como nunca o tinha visto antes.

— Onde encontraste isso?

— No motel… no quarto 12.

Ele sentou-se à mesa e passou as mãos pelo rosto.

— O teu avô… ele não era mau homem, Inês. Mas naquela noite… houve uma discussão por causa de dinheiro roubado ao patrão dele. O homem ameaçou denunciar o teu avô à polícia… E depois desapareceu. Nunca mais ninguém falou nisso.

As lágrimas corriam-lhe pelo rosto enrugado.

— Sempre pensei que tinha sido um acidente… mas agora já não sei.

Fiquei ali sentada em silêncio, sentindo-me traída por todos os lados: pela família, pelo passado e até por mim própria por querer saber demais.

Hoje olho para trás e pergunto-me se teria sido melhor nunca ter aberto aquele alçapão. Mas também sei que há verdades que precisam de ser conhecidas — mesmo que nos destruam por dentro.

E vocês? Já sentiram que descobrir a verdade pode ser mais doloroso do que viver na ignorância? Será que devemos sempre abrir todas as portas do nosso passado?