Quando o Passado se Recusa a Desaparecer: Como a Nova Namorada do Meu Ex-Marido Mudou a Minha Vida

— Mariana, não podes continuar a aparecer aqui sem avisar! — gritou o Rui, com a voz embargada de impaciência, enquanto eu segurava a mochila do Tomás à porta da casa dele. O olhar dele evitava o meu, fixando-se no chão como se ali encontrasse coragem para enfrentar-me.

Senti o sangue ferver-me nas veias. — Vim só trazer o casaco do Tomás, Rui. Está frio e ele esqueceu-se ontem. Não é preciso este teatro todo — respondi, tentando controlar o tremor na voz. Mas sabia que não era sobre o casaco. Nunca era.

Por trás dele, a Sílvia apareceu no corredor, braços cruzados e um sorriso frio nos lábios. — Mariana, talvez devesses ligar antes de apareceres. Aqui não é só tua casa, sabes? — disse ela, com aquela voz doce que usava sempre que queria parecer superior.

A minha vontade era responder-lhe à letra, mas respirei fundo. Não queria discutir à frente do Tomás, que espreitava da sala com os olhos grandes e assustados. Desde que o Rui começara a namorar a Sílvia, tudo mudara. Ela estava sempre presente, sempre a opinar sobre tudo o que dizia respeito ao meu filho. E o Rui… O Rui deixava-se levar por ela como se tivesse esquecido quem eu era.

Lembro-me do início: depois do divórcio, pensei que conseguiríamos manter uma relação cordial pelo bem do Tomás. Não foi fácil aceitar que o Rui já não me amava, mas aceitei. O que nunca imaginei foi que uma estranha pudesse entrar nas nossas vidas e virar tudo do avesso.

No início, tentei ser simpática com a Sílvia. Convidei-a para tomar café, tentei conhecê-la. Mas ela nunca quis saber de mim. Sempre que podia, fazia comentários passivo-agressivos sobre a minha casa, sobre a educação do Tomás, até sobre o meu trabalho como professora primária. “Deve ser difícil lidar com tantas crianças todos os dias…”, dizia ela, olhando-me de cima abaixo.

As coisas pioraram quando começaram as pequenas manipulações. O Tomás começou a chegar a casa com histórias estranhas: “A Sílvia disse que tu és muito ocupada e por isso não podes ir buscar-me à escola” ou “A Sílvia disse que devias arranjar um namorado para não estares tão triste”. Cada frase era uma facada.

Confrontei o Rui várias vezes. — Não vês o que ela está a fazer? Está a tentar afastar-me do nosso filho! — dizia-lhe eu, desesperada.

Ele encolhia os ombros, cansado: — Mariana, estás a exagerar. A Sílvia só quer ajudar. Devias agradecer-lhe por tratar tão bem do Tomás.

Agradecer? Como podia agradecer alguém que me roubava o papel de mãe aos poucos? Comecei a sentir-me impotente. O Tomás começou a preferir ficar mais tempo na casa do pai. Quando vinha para minha casa, estava calado, distante. Perguntava-lhe se estava tudo bem e ele respondia sempre: “Está tudo bem, mãe”, mas eu via nos olhos dele que não estava.

Uma noite, depois de o deitar, sentei-me no sofá e chorei como há muito não chorava. Senti-me sozinha, derrotada. Liguei à minha irmã, Inês.

— Mariana, tens de lutar pelo teu filho. Não deixes que ninguém te roube isso — disse ela com firmeza.

No dia seguinte, fui falar com a psicóloga da escola onde trabalho. Contei-lhe tudo: as manipulações da Sílvia, a passividade do Rui, o afastamento do Tomás.

— Mariana, tens de criar momentos só teus com o Tomás. Mostra-lhe que estás presente e disponível para ele — aconselhou-me.

Comecei então a fazer programas especiais só para nós dois: passeios ao parque, tardes de cinema em casa, cozinhar juntos. Aos poucos, vi o sorriso do Tomás voltar. Mas cada vez que ele voltava da casa do pai, parecia trazer um peso novo nos ombros.

Um sábado à tarde, fui buscá-lo e encontrei-o sentado nas escadas do prédio do Rui, sozinho e cabisbaixo.

— O que se passa, filho? — perguntei-lhe, ajoelhando-me ao lado dele.

Ele olhou-me nos olhos e murmurou: — A Sílvia disse que eu devia chamar-lhe mãe…

Senti o chão fugir-me dos pés. Abracei-o com força e prometi-lhe ali mesmo: — Tu só tens uma mãe e sou eu. Ninguém pode mudar isso.

Nesse dia decidi que não podia continuar calada. Marquei uma reunião com o Rui e levei comigo uma advogada. Expliquei-lhe tudo: as manipulações da Sílvia, os danos emocionais no Tomás, as minhas preocupações como mãe.

O Rui ficou em silêncio durante muito tempo. Pela primeira vez vi dúvida nos olhos dele.

— Eu… Eu não fazia ideia de que isto estava assim — murmurou ele.

A partir daí as coisas começaram lentamente a mudar. O Rui passou a impor limites à Sílvia e a respeitar mais o meu papel de mãe. Mas nada voltou a ser como antes.

Hoje olho para trás e vejo como fui ingénua ao pensar que um divórcio terminava apenas com uma assinatura num papel. As feridas ficam muito tempo abertas e as pessoas novas que entram nas nossas vidas podem trazer luz ou sombra.

Ainda luto todos os dias para proteger o meu lugar na vida do Tomás. Ainda tenho medo de perder o meu filho para alguém que nunca saberá amá-lo como eu amo.

Pergunto-me muitas vezes: quantas mães passam por isto em silêncio? Quantas lutam diariamente para não serem apagadas da vida dos filhos? Será justo termos de lutar tanto por algo que devia ser nosso por direito?