Depois do Divórcio do Meu Filho, Perdi a Minha Nora: De Repente Tornei-me uma Estranha

— Não quero falar sobre isso, mãe. Por favor, não insistas! — A voz do João ecoou pelo corredor, carregada de uma raiva que eu não reconhecia. Fiquei parada à porta da sala, com as mãos trémulas e o coração apertado. O silêncio que se seguiu foi ainda mais doloroso do que as palavras dele.

Nunca pensei que a minha família chegasse a este ponto. Sempre fui aquela mãe que fazia questão de manter todos juntos, de preparar almoços de domingo, de ligar só para saber se estava tudo bem. Quando a Catarina entrou na vida do João, há quase dez anos, senti logo uma afinidade especial. Ela tinha um sorriso aberto, um olhar sincero e um jeito de falar que me fazia lembrar os tempos em que eu própria era jovem e cheia de sonhos.

No início, claro, fui cautelosa. Toda a mãe quer o melhor para o filho e eu não era exceção. Observei-a com atenção nos primeiros encontros: como falava com o João, como tratava os outros à mesa, como se ria das minhas piadas antigas. Mas rapidamente percebi que ela era diferente das outras raparigas que ele tinha trazido a casa — não havia jogos nem fingimentos. Era genuína.

Com o tempo, a Catarina tornou-se parte da família. Ajudava-me na cozinha, contava-me segredos sobre o trabalho, ligava-me só para perguntar se precisava de alguma coisa do supermercado. Quando engravidou da minha neta Leonor, chorei de alegria. Senti-me abençoada por ter uma nora assim.

Mas os anos passaram e as coisas mudaram. O João começou a chegar mais tarde a casa, a responder torto, a evitar conversas profundas. Eu via a preocupação nos olhos da Catarina, mas ela tentava sempre disfarçar. Uma noite, depois de um jantar particularmente tenso, ela ficou na cozinha comigo enquanto lavávamos a loiça.

— Acha que ele ainda gosta de mim? — perguntou-me em voz baixa, quase como se tivesse medo da resposta.

Fiquei sem saber o que dizer. Abracei-a e disse-lhe que tudo ia correr bem, mas no fundo sentia que algo estava prestes a desmoronar.

O divórcio foi anunciado numa tarde chuvosa de novembro. O João apareceu em casa com uma mala e os olhos vermelhos. Disse apenas: — Acabou. Não dava mais.

A partir desse momento, tudo mudou. A Catarina deixou de me ligar. Quando tentava contactá-la para saber da Leonor, respondia-me com mensagens curtas e frias: “Está tudo bem.” “Não posso falar agora.” “Depois ligo.” Mas nunca ligava.

No Natal desse ano, preparei tudo como sempre: o bacalhau, as rabanadas, os sonhos de abóbora. Esperei até à última hora por um telefonema dela ou da Leonor. O João veio jantar comigo, mas estava ausente, agarrado ao telemóvel e sem vontade de conversar.

— Mãe, tens de perceber que agora é diferente — disse-me ele quando tentei falar sobre a Catarina. — Ela precisa de espaço.

Espaço? Depois de tantos anos juntas? Depois de tudo o que partilhámos? Senti-me descartada como se fosse um móvel velho que já não serve para nada.

Tentei aproximar-me da Catarina várias vezes. Uma vez fui buscá-la à escola da Leonor sem avisar. Ela ficou surpreendida ao ver-me.

— Olá, dona Teresa… — disse ela, usando um tom formal que nunca tinha usado comigo.

— Catarina… só queria ver como estavam…

— Estamos bem. Mas prefiro que me avise antes de vir buscar a Leonor — respondeu ela, olhando para o chão.

Senti uma dor aguda no peito. Queria abraçá-la, dizer-lhe que sentia a falta dela, das nossas conversas na cozinha, dos risos partilhados ao domingo. Mas ela já não era a mesma Catarina.

Os meses passaram e fui-me resignando ao silêncio. A Leonor vinha passar fins-de-semana comigo de vez em quando, mas estava sempre apressada para voltar para casa da mãe. O João arranjou outra namorada — uma tal de Patrícia — e parecia aliviado por não ter de lidar com os fantasmas do passado.

Uma noite, depois de mais um jantar solitário, sentei-me à mesa com uma chávena de chá e comecei a folhear um álbum antigo de fotografias. Lá estavam elas: eu e a Catarina na praia da Nazaré, rindo-nos enquanto a Leonor fazia castelos de areia; nós as duas na cozinha, com as mãos cobertas de farinha; a Catarina a segurar a Leonor recém-nascida com lágrimas nos olhos.

As lágrimas começaram a cair-me pelo rosto sem aviso. Senti-me tão sozinha como nunca antes na vida. O meu marido morreu há anos e agora parecia que tinha perdido também a minha nora — aquela filha que nunca tive.

Certa tarde encontrei a Catarina no supermercado. Ela estava com pressa, mas eu não resisti.

— Catarina…

Ela olhou para mim com um misto de surpresa e desconforto.

— Olá…

— Sinto tanto a tua falta… — disse-lhe num sussurro trémulo.

Ela hesitou por um segundo antes de responder:

— Não é fácil para mim… Tudo mudou…

— Mas eu continuo aqui…

Ela desviou o olhar e murmurou:

— Preciso de tempo…

Vi-a afastar-se pelos corredores do supermercado como se fugisse de um fantasma. Fiquei ali parada entre as prateleiras cheias de enlatados e pacotes de arroz, sentindo-me invisível no meio da multidão.

Às vezes pergunto-me se fiz alguma coisa errada. Se devia ter feito mais para manter a família unida ou se devia ter respeitado mais o espaço da Catarina depois do divórcio. Talvez tenha sido demasiado insistente ou demasiado presente quando ela só queria paz.

Agora limito-me a esperar por notícias da Leonor e a guardar as memórias dos tempos felizes num canto do coração. O João segue com a vida dele e eu fico aqui, à janela da sala, olhando para a rua vazia e perguntando-me se algum dia voltarei a ser mais do que uma recordação incómoda na vida da minha antiga nora.

Será que algum dia conseguimos reconstruir aquilo que perdemos? Ou há laços que se quebram para sempre quando o amor acaba entre duas pessoas? Gostava tanto de saber o que fariam no meu lugar…